Lima Duarte faz balanço de vida e da carreira e diz: 'Adoraria viver um gay'

05/07/2015 11h10


Fonte Ego

Lima Duarte chegou à entrevista já brincando e falando sobre o tênis colorido que usava. "É chamativo, né? Foi um presente da minha neta", contou, rindo. "Ela trabalha na marca que fabrica e disse que ainda nem chegou às lojas. E que vai custar mais de R$ 500! Tudo isso, vê se pode?".

Aos 85 anos - completados em março -, Ariclenes Venâncio Martins continua com a mesma energia de sempre, mas sua aparição na TV tem sido mais rara. Com mais de 60 novelas no currículo, além de filmes e peças de teatro, ele não atua em uma do início ao fim desde "Caminho das Índias" (2009). Recentemente, fez uma participação em "I Love Paraisópolis" como o mafioso Dom Peppino.

Em entrevista ao EGO, ele fala sobre temas diversos. Entre eles, sua opção em ficar cada vez mais em seu sítio no interior de São Paulo e o motivo de quase não ter trabalhado como diretor em sua carreira. "Sou muito bom ator para ficar como diretor. Todos esses diretores são atores muito medíocres", dispara.

Imagem: Roberto TeixeiraAos 85 anos, Lima Duarte faz balanço de vida e carreira: 'Valeu à pena'(Imagem:Roberto Teixeira)Aos 85 anos, Lima Duarte faz balanço de vida e carreira: 'Valeu à pena'

EGO: Em 2015, o senhor completou 85 anos. Que balanço faz da sua vida?
Lima Duarte: Sou um retirante, cheguei a São Paulo em um caminhão de manga. Não posso me queixar do caminho até aqui. Hoje chego ao Projac sendo uma das figuras mais proeminentes de lá, valeu à pena. As coisas boas que o dinheiro pode comprar, hoje eu tenho todas. Aquelas que o dinheiro não pode comprar, eu sempre tive.

Ainda falta interpretar algum tipo?
Gostaria de fazer o Sinhozinho Malta (de 'Roque Santeiro') revisto hoje em dia, com todos os problemas que o Brasil enfrenta. Ele estaria muito bem, né? Poderia estar envolvido em algum escândalo do petróleo ou das construtoras... Quem sabe (risos)? Mas Sinhozinho Malta sem (o autor) Dias Gomes é difícil...

Faltam bons papeis para a terceira idade?
Faltam sim, mas também falta um pouco de vontade de fazer dos idosos. Você pode pegar qualquer personagem e transformá-lo em um bom papel. Me dê o trabalho e vou ver o que posso fazer com ele. Se coloco minha experiência e visão de mundo, ele fica bom. Mas, se for muita bobagem, não vou. São 44 anos de Globo! Tem que ser algo me pegue, nem que seja uma vírgula.

O senhor já disse que autores e diretores têm medo de você. Ainda acha isso?
Eu sei muita coisa, né? Já fiz muita coisa... Dirigi 'Beto Rockefeller' (1968), 'O Direito de Nascer' (164), e até mesmo 'O Bofe' (1972), que foi um fracasso. Essa escala humana, eu percorri todinha. Então eles falam como deve ser feito e finjo que não sei. 'Ah, é assim que você quer? Tá legal'. Procuro tratar todo mundo bem. Mas é preciso viver 85 anos como eu vivi. Estar no primeiro dia da TV como eu estava. Esse é meu capital e patrimônio. Disso não abro mão.

Por que nunca mais dirigiu novela? Ficou traumatizado após o fracasso de ‘O Bofe’?
Trabalhei com Dias Gomes na Tupi. Quando nos encontramos na Globo, ele me disse que tinha um problema. Não sabia se me queria como ator ou diretor. Foi esse meu dilema na emissora. Sou muito bom ator para ficar como diretor. Todos esses diretores são atores muito medíocres (risos). Se eu tivesse agitado, teria trabalhado como diretor e logo ao lado do Boni.

Uma parcela do público rejeitou o beijo gay entre a Fernanda Montenegro e a Nathália Timberg em ‘Babilônia’. A sociedade encaretou?
Acho que houve estranhamento devido ao peso e à importância das duas. Com os rapazes (em ‘Amor à Vida’) não teve isso. Acho que o povo ficou chocado e se sentiu traído por ter mexido com a Fernanda.

O senhor interpretaria um gay?
(Animado) Eu adoraria! Na verdade, eu já fiz gay em um episódio do 'Você Decide’ e foi muito legal. Era dono de uma revista pornográfica e tinha um amigo cujo apelido era Hidrante (risos)! Era uma atuação discreta, estava no olhar. Em outro possível papel, eu também faria assim: algo mais interior e pesado. Não faria algo afetado.

E o beijo gay? Seria um problema?
Eu dei o primeiro beijo entre homens da TV. Foi no Cláudio Marzo no (programa) TV de Vanguarda, da TV Tupi. Querido Cláudio, outro amigo que se foi... Quando ele morreu, eu me lembrei dos lábios dele (risos). Mas beijo não é só a boca. Quem dá é a alma. E minha alma não beijou ninguém! Só a boca mesmo (risos).

E como foi esse beijo?
Foi na encenação de uma adaptação da peça ‘Um Panorama Visto da Ponte’, de Arthur Müller. Teve um beijo, mas muito bem colocado. Não foram essas bobagens assim, não... Meu personagem era apaixonado pela filha adotiva dele e suspeitava que o noivo dela fosse gay. Aí ele tascou um beijo no rapaz para desmoralizá-lo.

O senhor foi casado cinco vezes, mas hoje em dia vive sozinho em seu sítio. Cansou da vida a dois?
Eu me suicidei socialmente. Nunca gostei muito do glamour da profissão, não suporto isso. Operar a bunda, o nariz, cortar o peito, aparecer de biquíni na praia... Tudo é o glamour.

Mas o que casamento tem a ver com isso?
Casamento também é glamour! Nova mulher, trocou de mulher...

Não se sente sozinho no sítio?
Adoro morar lá. Olha, não gosto mesmo do glamour. E tudo é isso hoje em dia... A mídia, os amigos... A coisa em si não interessa pra ninguém. Interessa a periferia, que é o glamour. Que ator ele é, o que veste, como vai ao restaurante... Cansei disso. Mas vivo bem, muito bem.

Li em uma entrevista que o senhor foi ‘loucamente apaixonado’ por uma atriz.
Amei mesmo. Foi a Bibi Vogel. Olha, foi um lance (suspira)...

Como foi?
Trabalhamos juntos no Teatro de Arena e, no final da década de 70, fomos fazer uma temporada de ‘Arena conta Zumbi’ em Buenos Aires. O (Gianfrancesco) Guarnieri, que cantava, não pôde ir e convidei o (cantor) Antônio Marcos, que era casado com minha filha (Débora Duarte) para ir com a gente. Nessa época, ele queria ser ator. Na hora de dividir os quartos do hotel, houve uma saia justa. Ele pediu para ficar comigo porque não conhecia ninguém do elenco. Quando a Bibi soube disso, ficou muito irritada. Ela tinha planejado uma espécie de lua de mel pra gente por lá.

E aí?
Pedi a compreensão dela, mas não teve jeito. À noite, ela chegou e disse que era filha de alemães, que sua avó era bávara e que tinha levado a camisola da avó para passar a noite comigo. Nisso, fui grosseiro com ela. Disse que podia relevar tudo, mas camisola da vovó eu não aguentava. Depois disso, ela nunca mais falou comigo.

Como ficou depois disso?
Sofri muito... Pedi perdão, implorei, mas não adiantou. Logo depois, ela arrumou um namorado (o argentino Alfredo Zemma), ficou noiva e se casou em Buenos Aires. Com o tempo, fiquei mais compreensivo. Se fosse hoje em dia, teria agido diferente. Se fosse para viver um amor como esse, talvez não estivesse sozinho no sítio hoje em dia. Mas é muito difícil... Não existe outra como ela.

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Tópicos: ator, entrevista, diretor