Alexandra Szafir lanca livro sobre os excluídos pela Justica

30/05/2010 11h42


Fonte g1.com

Foi por sempre “meter o nariz onde não era chamada” que Alexandra Lebelson Szafir deu a dezenas de pessoas o direito a uma defesa justa. Foi com o mesmo nariz - que alguns diriam intrometido - que a advogada criminalista de 42 anos escreveu o livro que lança nesta segunda-feira (31), em São Paulo.

Imagem: (Foto: Daigo Oliva/G1)Clique para ampliarCom o nariz, Alexandra escreve em um teclado  virtual(Imagem:(Foto: Daigo Oliva/G1))Com o nariz, Alexandra escreve em um teclado virtual
“DesCasos: uma advogada às voltas com o direito dos excluídos” (Editora Saraiva) é um apanhado de histórias presenciadas pela autora em mais de dez anos de prática nos fóruns criminais. Nesse período, Alexandra conciliou seu trabalho como sócia de um importante escritório em São Paulo com a atividade gratuita prestada em penitenciárias, delegacias e associações.

rmã do ator Luciano Szafir, mãe de um casal de filhos (10 e 12 anos), Alexandra ganhou reconhecimento, recebeu do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) o Prêmio Advocacia Solidária e livrou da cadeia pessoas que passariam anos a fio sem ter direito a um defensor. Foi nesse período também que os primeiros sinais da ELA começaram a se manifestar.

ELA é a abreviação que mudou a vida de Alexandra e colocou seu nariz novamente em evidência. Esclerose Lateral Amiotrófica, a mesma doença do físico Stephen Hawking. Os primeiros sintomas começaram em 2005 e como ela descreve no livro “é um vilão bem pior que os seres humanos conseguem ser.”

Primeiro foram as pernas, depois as mãos e os braços também foram afetados. Em pouco tempo atingiu as costas, a capacidade de deglutir e falar. “Estava praticamente incomunicável, minhas ideias e meus pensamentos presos em minha cabeça”, relata Alexandra no livro.

Em seu quarto, ao lado da cama, livros empilhados e processos criminais disputam espaço com o respirador e todo o aparato necessário para mantê-la longe das complicações da doença. “Eu, que sempre prezei minha independência, tive que aprender a depender dos outros. Mas estou cercada de pessoas maravilhosas e não tenho vocação para ser infeliz, então minha vida familiar é o mais normal possível”, disse Alexandra ao G1, em entrevista por e-mail.

E-mail, computador, peças jurídicas, tudo isso graças ao seu nariz e a um software instalado no notebook por sua fonoaudióloga. O programa utiliza a webcam para reconhecer em seu rosto o ponto central: o nariz, que passa a comandar o mouse. Assim, cada letra vai sendo digitada em um teclado virtual

Alexandra levou cerca de dois anos para escrever o livro utilizando esse software. O que pode parecer resultado de um esforço sobre-humano se revela, na verdade, a consequência de um trabalho que nunca parou. “Meu trabalho hoje consiste, quase que todo, em redigir peças: defesas, habeas corpus. Mas, quando necessário, vou ao júri (escrevo meu texto de antemão), oriento outros advogados por e-mail ou Messenger. E, claro, continuo advogando gratuitamente”, afirma.

O que Alexandra relata nos 21 pequenos capítulos de seu livro mais do que surpreender, assusta. São histórias colhidas ao longo de mutirões carcerários, visitas às delegacias (numa época em que serviam de depósito de presos) e até mesmo em audiências.

São casos como o de José Roberto, um jovem paraplégico –após ser baleado pela polícia e que necessitava de cuidados médicos constantes– e que a promotoria insistia em colocar atrás das grades mesmo sem poder garantir sua integridade. As idas e vindas da cadeia de “Lady Laura”, uma senhora de 75 anos com claros problemas mentais; ou ainda o período de 1 ano e 8 meses de prisão de um acusado que morava na favela e não teve seu endereço encontrado por um oficial de Justiça, o que o levou à prisão. A narrativa de Alexandra corre solta e revela histórias de pessoas tratadas como não humanos.

Para ela, a razão de Carnegundes –outro personagem real de seu livro– ter sido preso sem direito a defesa, advogado e nem mesmo um juiz que pudesse julgar seu caso não é a desigualdade do Judiciário. “A razão porque os pobres passam mais tempo presos é que não há defensores públicos em número suficiente para levar os casos de réus pobres com rapidez ao conhecimento do Judiciário”, afirma.

ELA, ou Esclerose Lateral Amiotrófica, é uma doença rara e com causa ainda não completamente conhecida. Afeta os neurônios motores da medula espinhal e é progressiva.

Na maioria dos casos, leva de seis meses a um ano entre os primeiros sintomas e a completa paralisia, explica Jorge El-Kadum, titular e vice-presidente da Academia Brasileira de Neurologia (ABN) entre 2004 e 2008. “Quando começa a atingir a musculatura do bulbo cerebral começa a ter a falência respiratória”, diz.

Imagem: (Foto: Daigo Oliva/G1)No quarto de Alexandra, livros e documentos dividem espaço com aparelhos como respirador (Imagem:(Foto: Daigo Oliva/G1))No quarto de Alexandra, livros e documentos dividem espaço com aparelhos como respirador


Apesar da paralisia, a sensibilidade em todo o corpo é preservada. No entanto, não existe cura e as complicações podem se tornar constantes. “Existe sempre o risco da aspiração pulmonar, por isso é importante que o paciente fique sempre sob cuidados”, afirma El-Kadum.

Casos em que a doença evolui mais lentamente são mais raros, mas podem acontecer. “Cerca de 10% dos pacientes tem uma evolução da ELA mais lenta”, diz o neurologista.

A renda do livro de Alexandra será revertida para a Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica (AbrELA).


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