Agatha Moreira é capa da Glamour de outubro

18/10/2024 10h56


Fonte Glamour

Imagem: Ivan Erick/Glamour BrasilAgatha Moreira para a Glamour.(Imagem: Ivan Erick/Glamour Brasil)Agatha Moreira para a Glamour.

"Eu tenho medo de não poder realizar, de não ser útil", me responde Agatha Moreira quando pergunto sobre o que temia, rebatendo a mesma pergunta que me fez a própria. A provocação veio do conceito deste ensaio, em que ela reinterpreta clássicos do cinema e da literatura em um conto de Dia das Bruxas fashion.

Ao contrário das obras fictícias, o temor da atriz de 32 anos foge da abstração e vai para o concreto. Há muitos elementos que, talvez, expliquem a repulsa da insuficiência diante do mundo. Dos mais práticos: ela não nasceu cercada de luxo, pelo contrário, passou boa parte da infância em Olaria, periferia do Rio de Janeiro, se dividindo entre a casa do pai e da mãe, que se separaram quando ela tinha três anos. Conheceu o trabalho também muito cedo ao modelar desde os 13 incentivada por uma tia – "você é alta, bonita", diziam para ela, uma criança tímida e pouco inclinada às travessuras.

Teve a oportunidade de passear por culturas distantes da brasileira nas asas da profissão, até que acabou em Nova York, onde recebeu uma ligação a convidando a fazer o teste para sua primeira novela, Malhação (2012). Mesmo sem acreditar, por senso de oportunidade e necessidade financeira, gravou um vídeo em casa e apostou ao enviá-lo a um produtor de elenco. Tornar-se estrela de novela sequer era sonho. "De onde eu venho, essas coisas não acontecem às pessoas", reflete. Ao receber um sim, comprou passagem de volta ao Brasil e inaugurou uma das melhores fases da própria vida, relembra. O pontapé havia sido uma dinâmica num palco de teatro anos antes, quando brotou o sentimento de "é isso que eu quero fazer pelo resto da vida".

Desde então, entrou numa jornada de feitos profissionais, com 11 novelas, em que encarnou da Marquesa de Santos, em Novo Mundo, à provocadora Kika, em Verdades Secretas, obra que considera um divisor de águas na própria carreira. "Era a minha terceira novela e o papel exigia disciplina e despudor muito grandes, entrega e desapego ao mesmo tempo", lembra.

Apesar de prática quando tem que ser – "não desejo uma festa de casamento", "cada vez quero menos ser mãe" – admite que o desafio está em entrar nas nuances. É o caso de Luma, protagonista que interpreta na atual novela das nove, Mania de Você, mais uma vez na Rede Globo. "Você tem que manter os contrastes ali dentro para que ela se torne minimamente interessante para o público", conclui. Na pele de uma personagem que sofre um golpe de amor, depois topa passar uma borracha na própria história por um depósito de 6 milhões em dinheiro, o método parece ter funcionado. Não raro, cenas do folhetim viralizam nas redes sociais pela sagacidade dos diálogos, humor ácido e carisma, é claro.

A sorte de interpretar papéis interessantes, a paixão por ser desafiada e a sede por muitas outras boas narrativas arrematam a trajetória acelerada de uma atriz disciplinada e de olhos atentos às boas chances. A seguir, ela se abre num papo íntimo e profetiza as próximas realizações. Afinal, parar não é uma opção.
Imagem: Ivan Erick/Glamour BrasilAgatha Moreira para a Glamour.(Imagem:Ivan Erick/Glamour Brasil)Agatha Moreira para a Glamour.

A Luma está entre a vilã e a mocinha. Isso é mais difícil para a construção da personagem?

Com certeza. Não se pode entregar uma personagem em branco. Você tem que manter os contrastes ali dentro para que ela se torne minimamente interessante para o público. É um cuidado o tempo todo para não se direcionar a lado nenhum. Decupo as intenções dela em cada cena.

Como chegou à dramaturgia?

Aos 19 anos, fui a um ensaio de uma peça de amigos e a diretora me colocou no palco. Quando estava lá, pensei: "Nunca mais vou sair daqui. É isso." Passei a juntar dinheiro para fazer a escola de teatro da CAL [Casa das Artes de Laranjeiras, no Rio de Janeiro] porque meus pais não tinham condições de pagar. Decidi embarcar para Nova York numa última temporada como modelo para conseguir grana. Passei seis meses e nada, inclusive, tive um prejuízo horroroso de US$ 3.000 para tratar os sisos. Já estava desmotivada, até que recebi um teste de Malhação. O produtor de elenco, Fabio Zambroni, já havia me mandado antes, mas nem dei bola, porque nunca achei que passaria e nem teria como comprar uma passagem só para isso. Na segunda vez, peguei o texto, fiz um vídeo em casa e mandei. Ele me ligou dizendo que estava aprovada, para voltar ao Rio de Janeiro no dia seguinte. Fui embora morrendo de medo, mas existem momentos na vida de quem não tem dinheiro em que não há muita opção; ou você vai ou você vai.

Até então, você não sonhava em fazer novela?

Quando você cresce no subúrbio do Rio, essa é uma realidade tão distante, representava o impossível para mim. Quando recebi essa proposta, até fui atrás de me informar com uma tia, que é mãe da Samara Felippo, para ver se o produtor realmente trabalhava lá ou se era uma pegadinha. Não era, e a experiência de Malhação foi uma das fases mais legais da minha vida.

Doze anos depois, considera algum papel como um divisor de águas na sua carreira?

Sim, em Verdades Secretas. Eu era muito nova, já um grande desafio. Conversei com diversas amigas, atrizes, e muita gente não teria coragem de fazer. O papel exigia disciplina e despudor muito grandes, entrega e desapego ao mesmo tempo. Ela me provou o tamanho da responsabilidade que a gente pode assumir, sabe? Diante da empresa, dos diretores... Acho que é importante mostrar o quanto se é eficiente, responsável e dedicada. Um papel de tanta relevância te oferece isso.

Você falou sobre entrega e despudor. Sentia algum nível de timidez em razão da exposição do corpo e da intensidade das cenas?

Até hoje, lembro que estava contracenando com o Reynaldo Gianecchini no primeiro dia e ele foi maravilhoso. Tentou me proteger para que me sentisse confortável. Estava só começando na Rede Globo, era a minha terceira novela, não conhecia bem a equipe. O meu pudor era lidar com essas novas pessoas. Na moda, estamos acostumadas a tirar a roupa em qualquer lugar e situação, então não era sobre corpo, mas, sim, a vergonha da falta de intimidade com o time. Na segunda temporada, já tive uma liberdade maior para falar qualquer coisa, sugerir que a câmera ficasse mais para cá ou para lá… Foi um ganho.

Para a Luma, precisou cortar o cabelo curtinho. Como lida com as exigências físicas das personagens?

Gosto muito! Sempre fui a pessoa do mesmo corte de cabelo. Fiz até uma aposta no colégio com uma amiga, aí perdi e tive que cortar franja – foi o terror. Quando comecei a me transformar para personagens, tomei gosto. Já precisei ganhar peso para fazer a Domitila, em Novo Mundo; agora, a Luma começou com 17 anos e eu senti que era bom trazer um ar fraquinho num corpo mais magro. Se é para malhar, malho. Se é para engordar, vamos nessa.

Sente-se pressionada por algum padrão estético?

A minha pressão estética é comigo mesma. Infelizmente, cresci dentro dos padrões do mundo da moda e foi assim que a minha persona se desenvolveu desde que eu era uma criança. É muito difícil. Às vezes, é uma briga minha comigo, de falar que não preciso me cobrar tanto, mas não aprendi a ser diferente. Hoje, já consigo manter o equilíbrio de uma rotina de exercícios, uma boa alimentação, que me deixam satisfeita. O que mais me abala a autoestima é quando falam do meu trabalho. Isso me pega. Sempre digo que na internet existe um culto à depreciação, uma coisa horrorosa. E aí tenho que fazer o exercício de não ligar e procurar as críticas construtivas.

É alguém que tem medo de envelhecer?

Olha, lido bem no hoje. Fiz uma personagem com 17 anos, aí pensei: "Acho que não vai dar para esperar até os 35 para aplicar toxina botulínica" e coloquei (risos). Até então, só tinha passado por procedimentos estéticos nada invasivos, sem perfuração. Não sou a maior fã de agulhas! Acho que não tenho propensão a perder a mão em tratamentos. O medo de envelhecer, no momento, está mais em outros lugares do que na vaidade.

Você comentou sobre intimidade em cena… Sei que começou a trabalhar cedo, em ambientes nem sempre gentis com mulheres. Em algum momento da sua carreira já se sentiu constrangida ou assediada?

Sim. Inclusive, por fotógrafos famosíssimos. Uma vez, aos 19 anos, estava posando em Nova York e o fotógrafo sugeriu que fizéssemos um clique completamente vestida e, outro, nua. Só que isso não fazia sentido ali. Em situações assim, ficamos acuadas. Tenho orgulho de mim por ter dito não, porque é difícil… O mercado te faz se sentir boba por não topar. Nós, mulheres, passamos muito tempo sem voz ou considerando constrangedor tê-la. Não quero que as próximas gerações passem por isso.

A Luma sofre um golpe de um cara que amava, mas na vida real você vive um relacionamento bem sucedido. Como é a convivência com o Rodrigo, que também divide o ofício com você?

Muito boa! Agora ele voltará ao Rio, porque estava em São Paulo trabalhando. Quando chega, já assume parte da responsabilidade da casa, a gente é parceiro e se divide bem nisso. Por outro lado, também aprendemos a não criticar os momentos em que estamos separados. O que eu vivo comigo mesma, e ele também, é importante para a nossa individualidade. Somos pessoas que necessitamos disso.

No ano passado, o Rodrigo disse publicamente ser bissexual. Isso foi algo a se lidar dentro do relacionamento?

Nunca foi. A gente se conhece desde 2012. Quando você namora um amigo, não tem como não saber (risos). Na cabeça das pessoas, a orientação sexual dele era uma grande novidade para mim. Muito me impressiona, na verdade, perceber que vários casais não têm diálogo. Então o normal seria que eu não soubesse? Você aí que está lendo esta matéria: se você tem um parceiro e não eram amigos antes, por favor, se tornem amigos agora. Conversem! É importante.
Imagem: Ivan Erick/Glamour BrasilAgatha Moreira para a Glamour.(Imagem:Ivan Erick/Glamour Brasil)Agatha Moreira para a Glamour.

Pensam em oficializar o casamento?

Não! Não tenho vontade mesmo, nem desejo me vestir de noiva. Eu sempre falo que, quando era modelo, fiz tantos catálogos de casamento que acabou meu encanto. No primeiro, foi legal, "meu Deus, como estou linda", mas no 12º… Por enquanto, eu gostaria de fazer uma festa de aniversário, e nem isso eu tenho a capacidade (risos).

E a maternidade? Está nos planos?

Sempre fui uma pessoa maternal. Cuidei dos meus sobrinhos desde nova, já troquei muita fralda. Gastei esse meu lado (risos). A cada dia que passa, quero menos ser mãe. Fico nessa dúvida achando que escolher não ser mãe é egoísta da minha parte, por não querer dividir meu tempo e espaço, porque seria aquela que se doa 100%, sabe? E, se eu decidir ter um filho, também me acharei egoísta, porque não sei se está maneiro botar uma criança no mundo. Então a gente congela os óvulos e vê o que faz lá na frente. Tenho quase certeza que não será antes dos 40, se rolar.

A carreira internacional é um desejo?

Tenho muita vontade de trabalhar em Madri e fazer uma obra em espanhol. Também amaria fazer um filme hollywoodiano. Mas acredito também que somos um país com a faca e o queijo na mão para produzir a próxima série viral internacional. Temos capacidade e profissionais para tanto. Existe essa mania de achar a grama do vizinho mais verde e esquecer de valorizar o que há em casa.

O que te move a fazer novela entre tantas opções de formatos audiovisuais?

O desafio. Às vezes, num dia, você tem 20 cenas. Cada uma delas é uma estreia e cada estreia acontece, praticamente, sem ensaio, diante das milhares de pessoas que vão assistir. Além disso, é o único produto que basta que tenham uma TV para ter acesso. É gratuito para se emocionar, rir e chorar. A gente está na casa de milhares de brasileiros tocando os corações, sendo companhia. É uma parte muito especial da nossa cultura.

Falando em futuro, algum sonho profissional para profetizar por aqui?

Quero fazer um filme do [Pedro] Almodóvar.


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Tópicos: corpo, ensaio, personagem