Déa Lúcia: "Homem não gosta de mulher igual a mim, eles tem medo, querem uma senhorinha quietinha"

08/03/2024 11h53


Fonte Revista Marie Claire

Imagem: Globo/ Manoella MelloDéa Lúcia abre o coração e conta o que tem por trás da mãe que o Brasil abraçou.(Imagem:Globo/ Manoella Mello)Déa Lúcia abre o coração e conta o que tem por trás da mãe que o Brasil abraçou.

Aos 76 anos, Déa Lúcia virou um verdadeiro fenômeno das tardes de domingo no Domingão com Huck, da TV Globo. Você, que estava acostumada a assisti-la através das atuações de seu filho, Paulo Gustavo, falecido em decorrência da COVID 19 em maio de 2021, agora vai conhecer mais a fundo o que a televisão e as telonas de cinema ainda não mostraram: uma mulher poderosa, inspiradora e que vai muito além das caixas onde foi colocada.

Para comemorar o Dia da Mulher, Déa Lúcia dá uma entrevista exclusiva para Marie Claire, na qual faz um passeio espirituoso pela sua carreira na televisão, o etarismo que não deixa barato, a liberdade e o sexo na terceira idade e muito mais.

Leia abaixo na íntegra:

MC: Muitas pessoas te conhecem como a "Dona Hermínia da vida real". Mas você é isso mesmo? Como você definiria a Dona Déa Lúcia para quem não te conhece?
DL: A Dona Hermínia eu costumo dizer que é um clã. A minha avó era essa pessoa que eu sou e que Paulo Gustavo retratou muito bem e puxei essa coisa dela. A minha vida toda eu batalhei, trabalhava de dia para comer de noite, cantava de noite para comer de dia. Foi uma vida de luta. Nos últimos anos, Paulo Gustavo conseguiu atingir um certo status financeiro e ele falou para mim: "Agora chega, você não vai mais trabalhar" e foi aí que passei a dar mais trabalho pra ele. [risos]

MC: Nos últimos anos você se tornou uma grande figura da TV brasileira. Por que decidiu se aventurar nessa carreira?
DL:
Foi o Luciano [Huck] que me obrigou. [risos] Ele já era amigo de Paulo Gustavo. Quando ia fazer um ano do acontecido, o Luciano me chamou para participar do programa e eu e Angélica seríamos as juradas artísticas da Dança dos Famosos. Eu não falava muito, mas fiz brincadeiras, foi divertido. E aí, quando chegou no final de 2022, ele falou: "Vem, Dona Déia". Fiquei resistindo, mas agora estou aí, contratada.

MC: Como foi essa sua transição de mãe, trabalhadora, para apresentadora?
DL:
Fiquei um pouco com medo, mas de uma certa maneira foi bom para mim. As pessoas me dizem que sou forte, mas digo que tenho três pilares que me sustentam: a fé - não sou aquela pessoa de ficar na igreja, já passei por todas as religiões e agora sou Ecumênica -, que tenho muita, a família e o trabalho. Esse último, inclusive, foi uma das melhores coisas que me aconteceram, mesmo que canse para cachorro [risos]. Não sei por quanto tempo vou ficar ou quanto que vou aguentar, mas está sendo muito bom trabalhar porque me dá um gás para o resto da semana, ocupa minha vida.
Imagem: Globo/ Manoella MelloDéa Lúcia reflete que voltar a ter uma rotina de trabalho deu um novo sentido na sua vida.(Imagem:Globo/ Manoella Mello)Déa Lúcia reflete que voltar a ter uma rotina de trabalho deu um novo sentido na sua vida.

MC: E com essa presença, aumenta também a proximidade do público com você, que se sente praticamente da sua família. O que você mais gosta dessa sua relação com o eles? E o que mais te incomoda?
DL:
Eu adoro receber o carinho das pessoas nas ruas. A única coisa que me incomoda é a inconveniência. [risos] Mas recebo muito carinho, esses dias uma senhora de 80 e poucos anos me parou na rua e disse que adora me assistir aos domingos.

MC: Você é uma mulher à frente do seu tempo e inspiradora para muitas outras de diferentes gerações. Na Marie Claire falamos justamente com mulheres como você, que não têm medo de falar e ser quem são, e dos direitos das mulheres. Nesse assunto, qual é a sua opinião sobre o debate político em relação ao aborto?
DL:
Vou fazer 77 anos, na minha época não tinha modernismo nenhum. Sempre fui uma pessoa "para frente". O pai do meu ex-marido, Júlio, era um psiquiatra e já falava sobre o empoderamento da mulher. Eu escutava, mas não nasci muito para casar não, tá? Eu nasci para ter filho. E quando percebi que o meu era gay, soube que tinha que proteger meu filho, então nunca fui como as mães que escondem e recriminam, estou sempre à frente do meu tempo. Em relação ao aborto, é o seguinte: eu, Déa Lúcia, talvez não faria. Mas acho que é uma necessidade, porque sou do tempo em que as mulheres colocavam agulha de crochê para abortar e já vi milhares e milhares morrendo porque não tinha uma clínica que as atendessem com isso. Se eu fosse parlamentar, votaria a favor do aborto porque ele protege a mulher nesse sentido. Agora se for entrar na questão religiosa, acho dez vezes pior ter um filho e abandonar. Outro dia eu li que o maior aborto que existe é o pai que não quer seu filho.

MC: E sobre o seu dia a dia, os seus hobbies, o que te diverte?
DL:
Ficar em casa. [risos] Todo mundo cai duro quando falo isso. Não sou uma pessoa de rua, que sai de casa, gosto de ver televisão. Agora só assisto filme de Papai Noel e beijo na boca, a vida tá muito dura. Só filme de homem bonito. [risos]

MC: Antes de ser mãe, avó, você é, acima de tudo, uma mulher livre e independente, orgulhosa das suas escolhas. Como é a sua vida amorosa?
DL:
Solteira! Você acha que quero aporrinhação na minha vida? Homem não gosta de mulher igual a mim, eles tem medo. [risos] Querem uma senhorinha quietinha e não sou essa pessoa. Beijar na boca é muito bom, a vida sexual está ativa. Sábado eu vou a São Paulo, consigo ter minha privacidade, sou malandra dos anos 47, não sou igual a vocês que hoje em dia só querem aparecer. [risos]
Imagem: Globo/ Manoella MelloSem papas na língua Déa Lúcia não dá ibope para o etarismo.(Imagem:Globo/ Manoella Mello)Sem papas na língua Déa Lúcia não dá ibope para o etarismo.

MC: No auge dos seus 76 anos você traz sempre para a pauta que não existe limite para se reinventar. Você já se sentiu hostilizada ou diminuída por causa da sua idade?
DL:
Não, primeiro que não dou confiança. Se eu ler algo do tipo já paro, não ligo para essas pobrezas de espírito.

MC: O que tem a dizer sobre essa indústria que tende a apagar mulheres depois que elas ficam mais velhas?
DL:
A minha cabeça é de 30 anos, querida. [risos] Vai apagar o que? Meu corpo? Não querem me ver, mas foda-se, eu vou falar e vão ficar me ouvindo. Não sou atriz, mas se fosse estaria muito aborrecida, porque são vários artistas maravilhosos de idade que só tem a acrescentar com seu talento e estão aí parados, sofrendo pressão estética para mudar a aparência, perder a essência.

MC: Em 2024 completará 3 anos que Paulo Gustavo nos deixou. Como é sua relação com o luto nesse momento?
DL:
Eu sinto saudade de Paulo Gustavo, muita! Tem hora que dá um desespero, mas eu mesma me controlo. Choro se precisar chorar, mas choro sozinha, de noite, quando estou comigo no meu quarto.

MC: Qual foi o maior legado que o seu filho te deixou? E qual legado você quer deixar?
DL:
"Rir é um ato de resistência", essa frase dele. Não adianta você querer ver o mundo através de lágrimas, briga, sofrimento... vamos mudar as coisas, viver de uma maneira leve. Ele nos deixou isso e é o que eu quero deixar também.

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