Paola Antonini diz que choro em série sobre boate Kiss foi real e relembra amputação

02/02/2023 09h49


Fonte Revista Quem

Imagem: Reprodução/NetflixPaola Antonini como Grazi em Paola Antonini como Grazi em "Todo Dia a Mesma Noite"

Paola Antonini, de 28 anos de idade, fez sua estreia como atriz em Todo Dia a Mesma Noite. A série da Netflix, homônima ao livro de Daniela Arbex (2018), é uma dramatização da tragédia da boate Kiss, de Santa Maria (RS). Em 2013, um incêndio causado por diversas irregularidades na casa noturna deixou 242 mortos e 636 feridos. No ano passado, a Justiça do Rio Grande do Sul anulou a sentença do caso, e os quatro condenados foram soltos.

Na trama, Paola vive Grazi, personagem inspirada na sobrevivente Kelen Ferreira, que teve a perna amputada devido ao incêndio — além de diversas queimaduras no corpo. Em entrevista exclusiva, a atriz estreante conta que deu tudo de si nos dois testes para levar a representatividade de sua amputação à história que comoveu o Brasil e o mundo.

“Atuar sempre foi algo que tive dentro de mim, mas pensava que teria que estudar muito e seria uma longa caminhada. Quando surgiu o convite, achei importante. Queria muito passar e fazer essa personagem, que passa por uma amputação. Achava valioso que eu estivesse ali atuando. Estudei muito, me dediquei demais e me apaixonei por atuação. Ao mesmo tempo que me abria para novas experiências, já que nunca tinha atuado, fui me conhecendo muito também. Nessa, a gente começa a ver a vida com outros olhos. Fui crescendo e aprendendo muito”,
reflete.
Imagem: Reprodução/Instagram  Paola Antonini no set de Paola Antonini no set de "Todo Dia a Mesma Noite"

Paola tem compartilhado nas redes sociais todos os posts com menção a ela de espectadores da série, além de ter vibrado com o desempenho da trama. Todo Dia a Mesma Noite segue em primeiro lugar na plataforma desde sua estreia, em 25 de janeiro.

“Não esperava a repercussão. Fico grata e surpresa. Foram muitas mensagens acolhedoras, o que me deixa muito contente. Dei o meu melhor, estudei, coloquei meu coração ali e me abri de verdade. Em atuação, não dá para ficar na superfície. Tem que mergulhar, se dedicar por completo. Só queria contar essa história da melhor forma, e espero que tenha conseguido. Acho que as pessoas ficaram felizes com a questão da representatividade, por eu ser uma pessoa com deficiência, o que é importante mesmo”, avalia.

A artista teve alguns meses de preparação antes de ir para frente das câmeras, estudando atuação do começo, com leituras diárias de roteiro, do livro de Daniela Arbex, notícias sobre o caso e julgamento. Mesmo com tamanha imersão, ela dispensou preparação psicológica.

“Houve um apoio muito grande de direção, produção e colegas de elenco. A gente sabia que estava lidando com um tema muito delicado e tinha que tratar de forma respeitosa, com os personagens e com a gente. Minha preparadora falou: Sei que a gente vai mexer com você um pouquinho, porque você vai lembrar algumas coisas que você viveu”, relembra Paola, que perdeu a perna esquerda num acidente há oito anos, em Belo Horizonte. Na época com 20 anos, ela foi atingida por um carro quando guardava bagagens num veículo que estava estacionado.
Imagem: Reprodução/Instagram  Paola Antonini (Imagem:Reprodução/Instagram ) Paola Antonini

Paola e parte do elenco fizeram uma visita a Santa Maria dias antes da estreia da série. Na ocasião, ela encontrou a sobrevivente que serviu de inspiração para sua personagem.

“A gente passou na frente da Kiss, foi na associação, encontrou três pais e alguns sobreviventes. Foi muito marcante para mim, e já queria encontrar com Kellen há bastante tempo. Durante a preparação, a gente não teve contato nem com os pais [das vítimas], nem com ela. Ela sabia que eu estava fazendo a personagem, mas não houve troca. Fiz um bate e volta a Santa Maria com Thelmo Fernandes, Débora Lamm [que interpretam pais de vítimas na série] e nossa diretora. Falei para Kellen o tanto que coloquei meu coração ali. A história dela tinha que ser contada, e não está no livro da Daniela Arbex. Então, muita gente nem sabe que houve uma sobrevivente que perdeu a perna. Fiquei super emocionada”, conta.
Imagem: Reprodução/Instagram  Kelen Ferreira e Paola Antonini (Imagem:Reprodução/Instagram ) Kelen Ferreira e Paola Antonini

Espectadores têm relatado nas redes sociais a dificuldade de maratonar a série devido às cenas trágicas, e o mesmo ocorreu com Paola. A atriz não pulou nenhuma parte da trama, mas respeitou seu tempo para ver a obra pronta.

“Foi interessante assistir porque, por mais que eu tenha gravado, eu não fiz parte de vários núcleos. São imagens muito fortes, ainda mais que a gente sabe que retrata uma tragédia. Assisti parando para respirar porque não tem como não ficar emocionada. Antes da gente gravar, eu já chorava em algumas leituras. Eu e minha personagem tivemos vivências completamente diferentes, mas existe um ponto de ligação, que é o momento de acordar e ver que perdemos a perna. Relembrei muita coisa, mas foram reações diferentes. Depois do acidente, tive muito alívio, gratidão e pensei nos meus sonhos e no que ainda queria fazer. A Grazi tem uma gratidão por estar viva, mas existe um trauma, perdeu as amigas… na cena, a emoção foi verdadeira. Realmente me permiti e acabei lembrando um pouco de mim, pensando que as coisas poderiam ter sido diferentes. Hoje eu vejo o tanto de coisas lindas que aconteceram na minha vida, como ela se transformou para muito melhor. Mas aquela menina Paola de 20 anos, quando acordou, não fazia ideia disso. Estava cheia de medo e inseguranças. Acho que fui para esse lugarzinho da incerteza durante a cena”, relata.

Outra cena marcante da série é quando Grazi e outros sobreviventes observam seus corpos diante do espelho e fazem um ensaio fotográfico mostrando as marcas da tragédia, como queimaduras e amputações. Para Paola, sua experiência pessoal de se enxergar sem uma das pernas foi um processo desafiador.

“É difícil lidar com a mudança física. Ali, para Grazi, é um momento em que ela está passando por cima dos medos e olhando para algo muito maior. Quando eu perdi minha perna, houve uma insegurança sobre o que as pessoas pensariam quando eu aparecesse de prótese. Durou pouco, mas nos primeiros dias, eu usava saia longa. Minha primeira foto mostrando a prótese foi de shortinho, e vi que as pessoas acolheram. Depois, já fui para um biquíni. E a primeira vez que postei sem a prótese, também teve bastante interação. Esse despertar foi dia após dia, fui me adaptando com o corpo. Esta é minha nova imagem e vai ser assim enquanto eu existir. Foi um processo lento, delicado e respeitoso. Nos primeiros dias sem a perna, eu não olhava para a amputação. Olhei primeiro para ela enfaixada, depois sem faixa e depois no espelho, onde eu falei Nossa, dá pra ver mesmo que eu perdi minha perna. Não forcei nada. Oito anos passados, olho para essa perninha sem prótese e sei que é por ela que estou viva e realizando vários sonhos”, reflete.
Imagem: Reprodução/Instagram  Paola Antonini (Imagem:Reprodução/Instagram ) Paola Antonini


TRABALHO SOCIAL COM CRIANÇAS E JOVENS

Desde o seu acidente, ela visita crianças em hospitais, seja as que têm câncer ou as que passaram por alguma amputação. A modelo e atriz, então, usa parte do que ganha com seus trabalhos e reúne os seguidores numa vaquinha para comprar próteses para os pequenos que precisam. Em 2020, durante a pandemia, ela teve tempo para se dedicar a questões burocráticas e fundar o Instituto Paola Antonini, que já atendeu cerca de 25 crianças e jovens nestes dois anos.

“Eu queria aumentar ainda mais esse trabalho, doar próteses para crianças e jovens do Brasil inteiro. Sei que tenho acesso a oportunidades incríveis e uma voz que chega a muita gente, mas não quero que só eu tenha isso. Quero que outras crianças e jovens tenham próteses de qualidade para terem a vida que merecem e irem atrás de seus sonhos. A gente cuida de toda a reabilitação de crianças com deficiência física, principalmente amputadas. O instituto está em Belo Horizonte, mas logo vai ter uma sede em São Paulo. Recebemos os pequenininhos e eles voltam porque o pé cresce, então tem esse custo de manutenção, e jovens de até 21 anos. Daqui a pouco, eu quero ajudar mais jovens e adultos de todas as idades”,
deseja.

Uma frase de Paola que ficou famosa foi “Não quero minha perna de volta de jeito nenhum”. Para a atriz e modelo, sua amputação teve um desígnio muito maior do que poderia imaginar.

“Eu aprendi e mudei muito depois de perder minha perna. O propósito que ganhei e as lições que tive são muito mais valiosos do que a minha vida de antes, com a minha perna. Fisicamente, não quero minha perna de volta porque agradeço muito por ter sido escolhida para isso que passei. Eu sabia que tinha que ser comigo. Várias crianças me param e perguntam por que eu uso a prótese. A gente precisa falar e lutar cada vez mais por inclusão e diversidade. Aos 20 anos, tive a chance de conhecer esse mundo e fazê-lo virar a minha causa. Então, quero ter perninha brilhante para o resto da vida”,
declara.
Imagem: Reprodução/Instagram  Paola Antonini (Imagem:Reprodução/Instagram ) Paola Antonini



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Tópicos: acidente, perna, paola