Carlos, Erasmo..., álbum definidor do Tremendão, faz jus ao culto 50 anos após a edição original
26/05/2021 17h45Fonte G1
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MEMÓRIA – Nascido em 5 de junho de 1941, o carioca Erasmo Esteves tinha 30 anos e já era Erasmo Carlos quando, entre julho e agosto de 1971, lançou o LP Carlos, Erasmo..., sétimo álbum de discografia iniciada em julho de 1960 com a edição de single de 78 rotações por minuto gravado pelo artista como integrante do conjunto The Snakes.Decorridos 50 anos, Erasmo se prepara para festejar 80 anos de vida e o álbum de 1971 permanece como o disco mais cultuado da obra fonográfica desse cantor e compositor por vezes injustamente minimizado como parceiro colaborador de Roberto Carlos.
Primeiro álbum de Erasmo na Philips, gravadora de elenco estelar para o qual o cantor foi levado por iniciativa do executivo André Midani (1932 – 2019) após ter permanecido de 1964 a 1970 na nacional RGE, Carlos, Erasmo... apontou um caminho para o artista e consolidou virada esboçada a partir de 1969.
Ainda aturdido e perdido com o fim da Jovem Guarda, em junho de 1968, Erasmo refletiu sobre a vida na confessional balada Sentado à beira do caminho, parceria com Roberto Carlos apresentada na voz do Tremendão em single editado em maio de 1969.
Sentado à beira do caminho foi o marco inicial da discografia adulta do artista. Ficaram para trás a forjada fama de mau, as canções de amor pueril e os rocks adolescentes da Jovem Guarda, movimento pop encabeçado por Erasmo com Roberto Carlos e Wanderléa a partir de agosto de 1965.
Entraram em cena as experiências sensoriais com as drogas, as responsabilidades da vida adulta – simbolizadas pelo casamento com a namorada Sandra Sayonara Esteves (1946 – 1995), a Narinha – e a sintonia com a ideologia hippie, já perceptível na foto de João Castrioto exposta na capa do LP Carlos, Erasmo... e na atmosfera e poética de algumas músicas do álbum, sobretudo as da canção Gente aberta, uma das seis parcerias de Erasmo com Roberto Carlos incluídas entre as 13 faixas do disco.
Gente aberta, a rigor, havia sido apresentada em agosto de 1970 no single duplo que marcou a efetiva estreia de Erasmo na gravadora Philips.
Em março de 1971, outro single duplo com o samba-rock Maria Joana (outra parceria de Erasmo com Roberto) e 26 anos de vida normal – música dos irmãos Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle, também gravada por Marcos naquele mesmo ano para o álbum Garra (1971) – adiantaram duas músicas do LP orquestrado com produção musical dividida por Manoel Barembeim com o próprio Erasmo.
Na letra, Maria Joana aludia à maconha em gravação feita com o toque da Caribe Steel Band. Já 26 anos de vida normal fazia crítica à automação humana na capitalista civilização ocidental. Ambas as músicas foram orquestradas pelo arranjador Rogério Duprat (1932 – 2006), em elo tardio de Erasmo com a Tropicália, movimento organizado em 1967 por Caetano Veloso e Gilberto Gil.
A propósito, então em exílio forçado na Inglaterra, Caetano mandou de Londres a música mais conhecida do álbum, De noite na cama, gravada por Erasmo com arranjo que caiu no suingue do samba-rock-soul.
Por mais que tenha delineado a assinatura artística de Erasmo na vida adulta, dando rumo ao artista, o álbum Carlos, Erasmo... deve ser percebido como evolução natural do som feito pelo cantor no transitório álbum anterior, Erasmo Carlos e Os Tremendões (1970), LP no qual Erasmo apresentou o samba-rock Coqueiro verde, homenagem à musa Narinha feita em parceria com Roberto Carlos. Tanto que o maestro Chiquinho de Moraes é nome recorrente nos dois discos como arranjador.
Contudo, houve salto na ideologia de repertório que versava de forma libertária sobre sexo, com alusões às drogas – especificamente à maconha – e com reflexões sobre a vida no Brasil ditatorial de 1971.
Com faixas gravadas entre estúdios das cidades de Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP), sob direção de Paulo de Tarso e com os toques de músicos como Lanny Gordin (guitarra), Sérgio Dias (guitarra), o então mutante Liminha (no baixo e na guitarra), Ronaldo Leme (bateria), Régis Moreira (piano), Oswaldo Barro (cuíca), Dirceu Medeiros (berimbau) e Sérgio Fayne (violão), o álbum Carlos, Erasmo... traz a voz de Marisa Fossa – cantora revelada como vocalista do psicodélico grupo gaúcho O Bando – em Masculino, feminino, sensual e melancólica balada de autoria de Homero Moutinho Filho, compositor revelado na era dos festivais.