Claudio Nucci refaz belos caminhos melódicos na trilha afetiva do álbum Direto no coração

25/03/2021 17h57


Fonte G1


Imagem: ReproduçãoClique para ampliarO confronto entre presente e passado fica especialmente desconfortável na regravação da sempre lembrada Toada (Na direção do dia) (Zé Renato, Claudio Nucci e Juca Filho, 1978), fei(Imagem:Reprodução)
 “São tantos os momentos de partir / Tantos os desejos de voltar / Tantos novos rumos pra seguir / Tantos descaminhos”, reflete Claudio Nucci através dos versos escritos pelo parceiro Luiz Fernando Gonçalves para a letra de Vontade de viver, canção lançada por Nucci em 1981 em gravação feita com Nana Caymmi para o primeiro álbum solo deste cantor, compositor e violonista paulista projetado nacionalmente em 1979 como integrante do grupo vocal Boca Livre.

Vontade de viver reaparece com o devido lirismo – sublinhado pelos sopros das flautas arranjadas por Zé Luís e pelo toque do violoncelo de Jaques Morelenbaum – no álbum Direto no coração – 40 anos de acontecências.

No mercado fonográfico a partir de sexta-feira, 26 de março, com 13 faixas produzidas, arranjadas e editadas de forma independente pelo próprio Nucci, o disco celebra quatro décadas de carreira solo do artista, tomando como ponto de partida o álbum Claudio Nucci (1981), e não o single duplo editado pelo cantor no segundo semestre de 1980 – na sequência quase imediata da saída de Nucci do Boca Livre naquele ano de 1980 – com as músicas Acontecências (Claudio Nucci e Juca Filho, 1980) e Quero quero (Claudio Nucci e Mauro Assumpção, 1980).

Ambas, aliás, reaparecem em Direto no coração, álbum em que o artista realiza o desejo de voltar para repisar trilhas melódicas que reiteram o talento do compositor.

Acontecências ganha a voz de Renato Braz, entrelaçada em total harmonia com o canto sempre jovial de Nucci. Propagada na trilha sonora da novela Plumas & paetês (TV Globo, 1980 / 1981), a canção Quero quero é exemplo da habilidade do compositor para encontrar belos caminhos melódicos. Na gravação lançada neste ano de 2021, Quero quero ganha o frescor da voz de Chico Chico – convidado de Nucci na faixa – e é puxada para trilha ruralista pelo toque do acordeom de Antonio Guerra.

Mesmo tendo caráter revisionista, com baixo teor de novidade em repertório que apresenta duas músicas realmente inéditas e uma terceira a rigor já revelada por Nucci no bootleg Pirattyei-me, Direto no coração é álbum que sobressai na discografia do cantor pelo requinte. A sofisticação é perceptível, por exemplo, no piano tocado por Eduardo Taufic em leve clima jazzy na gravação de Amor aventureiro (1983). Ou no arranjo que deixa a pouco conhecida canção Levezinho (1981) livre e solta como passarinho fora da gaiola.

É fato que nem todo o requinte impede que sumam da memória registros originais imbatíveis. Reavivada por Nucci com a cantora Dri Gonçalves, a canção A hora e a vez, por exemplo, se ressente na atual abordagem da cruel comparação com a gravação feita por Nucci em 1985 com Zé Renato, colega do Boca Livre e parceiro (ao lado de Ronaldo Bastos) nessa composição difundida na trilha sonora da novela Roque Santeiro (TV Globo, 1985 / 1986).

O confronto entre presente e passado fica especialmente desconfortável na regravação da sempre lembrada Toada (Na direção do dia) (Zé Renato, Claudio Nucci e Juca Filho, 1978), feita por Nucci com Paulinho Moska. É difícil seguir outra toada que não seja a do Boca Livre em 1979 em gravação emblemática de esplendorosa harmonia vocal. Assim como é difícil ouvir Sapato velho (Mu Carvalho, Claudio Nucci e Paulinho Tapajós, 1978) – aqui calçado com a voz de Pedro Luís – sem pensar na combinação de vozes do grupo Roupa Nova em gravação de 1981.

Da mesma forma, é difícil para qualquer intérprete reeditar a emoção concentrada posta por Nana Caymmi na gravação original de Velho companheiro (Meu silêncio), canção de triste beleza melódica composta por Nucci em 1976 e letrada pelo primeiro parceiro do artista, Luiz Fernando Gonçalves, que derramou nos versos toda a dor pela partida de amigo que havia acabado de morrer.

E por falar em Luiz Fernando Gonçalves, ele é o letrista da inédita canção-título do disco Direto do coração. Mais sedutora, a outra das duas músicas inteiramente inéditas do álbum é Da nossa natureza, parceria do artista com o compositor e violonista Rafael Lorga – apresentada no disco em bonita gravação feita com as adesões vocais de Lorga, Dri Gonçalves e Vittória Braum – que se afina com o cancioneiro pregresso de Nucci, sem apontar novo rumo na estrada do compositor.

Há na canção Da nossa natureza uma envolvente leveza que contrasta com a suntuosa solenidade em que Nucci aclimata Me dá a mão (1983), parceria com o poeta Cacaso (1944 – 1987) regravada por Nucci somente com a própria voz e o violão, harmonizados com o violoncelo de Jaques Morelenbaum em atmosfera densa que sugere música de câmara.

Parceria de Nucci com o letrista Aldir Blanc (1946 – 2020), o samba Caçada humana – praticamente inédito, mas a rigor já registrado pelo cantor no já citado bootleg Pirattyei-me – tem tom político e fecha, sem impressionar, este afetivo álbum em que Claudio Nucci percorre os belos caminhos melódicos que, entre idas e vindas, vem seguindo ao longo de 40 anos de coerente carreira solo.