Marcelo D2 se aviva no samba contemporâneo de "Iboru", álbum com um punhado de bambas
20/06/2023 15h34Fonte G1
Imagem: Fábio TitoClique para ampliarMarcelo D2 se aviva no samba contemporâneo de "Iboru", álbum com um punhado de bambas
Desde que iniciou há 25 anos carreira solo com o álbum Eu tiro é onda (1998) sem deixar a liderança da banda Planet Hemp, Marcelo Maldonado Gomes Peixoto – vulgo D2 – burila a batida do rap com incursões pelo samba.
A diferença do nono álbum solo de estúdio do artista – Iboru, em rotação desde 14 de junho – para discos anteriores do cantor e compositor carioca é que, em vez de fazer rap com toque de samba, como em álbuns do quilate de À procura da batida perfeita (2003), título antológico da discografia solo de D2 que completa 20 anos em 2023, o rapper faz samba em Iboru.
Só que D2 cai no samba sem descartar os graves do hip hop, motes explícitos do afiado afro-trap Tambor de aço (Marcelo D2, Nave Beatz e Tropkillaz), faixa alienígena do disco, mas também presentes ao longo de álbum pautado pelo mix de percussões e programações. D2 tampouco deixa que o samba perca a supremacia ao longo das 16 faixas de Iboru.
Sim, Iboru é disco de samba, tal como o álbum de 2010 em que D2 adentrou os morros cariocas e fluminenses para abordar o repertório marginalizado do cantor e compositor Bezerra da Silva (1927 – 2005), mas Iboru tem a relevância de ser um disco de samba autoral.
O álbum flui bem. Após pedir passagem com o canto falado de Saravá (Marcelo D2 e Barba Negra), espécie de carta de intenções do disco e do artista, D2 apresenta o melhor samba da inédita safra autoral – composta por 12 das 16 músicas de Iboru – ao ecoar a ancestralidade de Clementina de Jesus (1901 – 1987) com a voz adicional de Nega Duda.
Trata-se de Povo de fé, luminosa parceria de D2 com o historiador e escritor Luiz Antonio Simas, também coautor (com D2 e Nave Beatz) do espiritualizado samba que encerra o disco, Pra curar a dor do mundo.
Na sequência, Até clarear (Arlindinho Cruz, Diogo Nogueira, Igor Leal e Inácio Rios) mantém a roda animada, soando como espécie de festa de arromba do pagode e reiterando o espírito gregário de Iboru, álbum que alinha, entre os convidados, um punhado de bambas do porte de Alcione, B Negão, Mateus Aleluia, Metá Metá, Xande de Pilares e Zeca Pagodinho.
“Só morro quando meu samba morrer”, sentencia D2 no verso-refrão-título do partido que compôs com Marcio Alexandre. A gravação embute locução de telejornal sobre a chegada do samba à cidade do Rio de Janeiro (RJ).
Parceria de D2 com Kiko Dinucci, Kalundu é samba assentado no terreiro mais ancestral e alicerçado pelo vocal de Mateus Aleluia, elo com a mãe África. Bamba de Sampa, Dinucci também assina com D2 Tempo de opinião – samba gravado com o toque levemente dissonante do trio Metá Metá e o canto de Juçara Marçal, vocalista do grupo paulistano – e Abrindo os caminhos (este com adesões de Cabelo e Nave Beatz na autoria).
Vinheta falada, Pedacinhos de Paulete é réquiem de D2 para a mãe, Paulete Peixoto, morta em 2021. Já O samba falará + alto (Marcelo D2 e João Martins) abafa as vozes de Alcione e Mumuzinho no canto coletivo deste tema que reverbera clichês em versos afirmativos que brotam nos férteis fundos de quintais nacionais desde que o samba é samba.
Duras penas é regravação do samba de Douglas Lemos e Moacyr Luz apresentado por Lemos em 2019, em rede social, e lançado oficialmente dois anos pelo artista depois no álbum Jogo de cintura (2021). Outro samba de lavra alheia, Gandaia (Romildo Bastos e Sergio Fonseca) valoriza disco que gravita em torno das rodas dos pagodes cariocas em Bundalelê (Carlos Sena, Otacílio da Mangueira, Xande de Pilares, Zeca Pagodinho), mix de samba e embolada.
Já Pra Marcelo (Marcelo D2, Marcelinho Moreira, Marcio Alexandre e Nave) cai no suingue do samba de morro e na batida do rap ao mesmo tempo em que ecoa de longe o balanço de Jorge Ben Jor no refrão.
No arremate do disco, no instante final do já mencionado samba Pra curar a dor do mundo, D2 reitera que somente morrerá quando o samba dele morrer.
E assim, harmonizados com o cavaco e com as programações de Nave Beatz, tocam os tambores de Marcelo D2 em Iboru, disco em que o rapper se aviva na cadência contemporânea do samba.
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