Maria Rita reaparece de cabeça feita em EP que expressa a fé da artista no samba e no Candomblé
18/08/2022 15h53Fonte G1
Maria Rita reaparece de cabeça feita no EP Desse jeito, disco que aporta amanhã, 19 de agosto, nos aplicativos de música. Convertida ao samba há 15 anos e ao Candomblé há três, a cantora paulistana expressa nas seis faixas do EP a fé na religião e no gênero musical que, desde o jovial álbum Samba meu (2007), pauta discografia inicialmente assentada sobre as bases da MPB que gerou a mãe da artista, Elis Regina (1945 – 1982), morta há 40 anos.
Disco que marca a entrada de Maria Rita na gravadora Som Livre, após passagens pela Warner Music (de 2003 a 2011) e Universal Music (de 2012 a 2021), o EP Desse jeito também marca a estreia da cantora como compositora. Maria Rita figura nos créditos autorais de duas das seis composições inéditas do EP Desse jeito.
Samba para rodar a saia no mar da Bahia, Canção da erê dela é a melhor das duas músicas da inicial safra autoral da artista. A composição fecha o EP em gravação viçosa feita com a adesão de Teresa Cristina, cantora e compositora também convertida ao samba e ao Candomblé.
“Abençoa a voz dela, Estrelinha”, roga Teresa Cristina ao fim da gravação, aludindo ao erê Estrelinha do mar. Como explica o texto de apresentação do disco, erês são – na mitologia do Candomblé – os seres intermediários entre as pessoas e os orixás, simbolizando o aflorar da criança que cada um guarda dentro de si.
Na narrativa do EP Desse jeito, Canção da erê dela representa o fim feliz de história que começa com a tomada de consciência do eu-lírico feminino de E eu?, samba de Fred Camacho, Fabrício Fontes e Cassiano Andrade que abre o disco.
“Jurei pra nunca mais me ver chorar / Hoje arrumei minha cabeça / Aquela bela vista foi miragem / O nosso sonho a dois nos separou”, canta Maria Rita, virando a mesa após encarnar uma Maria Bruaca na relação abordada na letra do samba. Tanto que o único choro ouvido ao fim dos três minutos e 46 segundos da faixa E eu? é o da cuíca.
Samba que batiza o EP, Desse jeito é parceria do recorrente Fred Camacho com Luiz Antonio Simas, autor dos versos que expõem rituais e costumes adotados pelos adeptos das religiões de matriz afro-brasileira, precisamente o Candomblé, como cuspir a canjibrina do santo e comer sarapatel na Ribeira (bairro de Salvador, capital da Bahia). Ao fim, a percussão da faixa evoca o baticum dos terreiros.
Na sequência do EP, o samba De bem com a vida externa o êxtase da paixão. É quando o canto de Maria Rita soa mais terno, um pouco mais sensual, quase maroto. Em seguida, o samba Por vezes evolui em cadência mais serena, com a voz de Maria Rita – autora da composição – em harmonia com o canto de Thiaguinho, convidado da faixa. Por vezes é samba que versa sobre a força ancestral que transcende a dimensão da matéria ao se fazer presente sem a necessidade do toque corporal.
Essa força também pode ser o poder da criação do samba, manifestação que se impõe na atribulação cotidiana, assunto de Correria, samba de Nego Álvaro e Elvis Marlon.
Aos 20 anos de carreira, iniciada em 2002 com shows com o guitarrista Chico Pinheiro e participações em álbuns de Milton Nascimento e do próprio Chico Pinheiro, Maria Rita volta ao disco com EP coerente com a fé depositada no samba a partir de 2007.
Desse jeito pode não ser o disco pelo qual os seguidores de primeira hora da cantora – admiradores dos álbuns Maria Rita (2003) e Segundo (2005) – aguardam há anos com ansiedade contida.
Preferências à parte, trata-se de bom disco que mantém Maria Rita na roda na qual ela quis entrar, buscando dar a voz privilegiada a um samba que é dela, agora inclusive literalmente, já que a cantora também se apresenta como compositora. Maria Rita está com a cabeça feita.