Romulo Fróes faz 50 anos e acerta no "erro" de fazer dois discos distintos com repertório igual
20/06/2021 15h34Fonte G1
Imagem: DivulgaçãoRomulo Fróes faz 50 anos e acerta no "erro" de fazer dois discos distintos com repertório igual
“Vai dar errado”, profetiza Jards Macalé na abertura de Ó nóis, um dos dois álbuns lançados por Romulo Fróes neste domingo, 20 de junho, dia do 50º aniversário deste vanguardista cantor e compositor paulistano nascido em 20 de junho de 1971.
Ó nóis chega ao mundo digital pela gravadora YB Music na companhia de disco gêmeo, Aquele nenhum, álbum com o qual se une pelo fato de ambos apresentarem o mesmo repertório autoral com sonoridades distintas.
A sentença de Macalé – que deve ser entendida como a propensão de Fróes de acertar ao apostar no que pode ser considerado um erro pela visão empresarial dos gestores do mercado da música – já foi ouvida há 15 anos quando o artista ofereceu a Macalé um exemplar do então recém-lançado segundo álbum solo de Fróes, Cão (2006).
“Vai dar errado”, avisou Macalé na época, intimamente orgulhoso do erro do colega. Como a vida deu voltas, Romulo Fróes acabou sendo um dos arquitetos do aclamado último álbum de Macalé, Besta fera (2019), e também virou parceiro do compositor carioca, ele também dono de trajetória orgulhosamente errática.
Sobra do repertório de Besta fera, Baby infeliz (Jards Macalé, Guilherme Held, Romulo Fróes e Nuno Ramos) ganha registros simultâneos nos dois álbuns de Fróes com letra que alude a títulos emblemáticos do cancioneiro de Macalé, como Anjo exterminado (1972) e Movimento dos barcos (1971), parcerias do compositor com o poeta Waly Salomão (1943 – 2003).
No álbum Ó nóis, a música Baby infeliz é ouvida entre dissonâncias e ruídos que pavimentam este disco cheio de barulhos feios. No álbum Aquele nenhum, Baby infeliz aparece em registro mais certinho de voz e violão.
O mesmo acontece com composições como Aquele nenhum (Romulo Fróes), Braço magro (Romulo Fróes e Alice Coutinho), Minha música (Romulo Fróes e Nuno Ramos), Me olha e manda (Romulo Fróes e Alice Coutinho) e Numa cara só (Romulo Fróes e Clima). E o resultado é interessante.
Ambos os discos foram produzidos por Frederico Pacheco com o próprio Romulo Fróes. Outro traço (literal) em comum entre os álbuns Aquele nenhum e Ó nóis é a arte gráfica criada por Thiago Lacaz.
Contudo, há sutis diferenças no repertório. Ó nóis inclui interpretação a capella do samba Aos pés da cruz (Zé da Zilda e Marino Pinto, 1942) em registro nu que poderia figurar em Aquele nenhum – se não tivesse sido acoplado à gravação ruidosa de Elza aqui (Romulo Fróes e Nuno Ramos, 2019), música lançada há dois anos em single.
Há ainda em Ó nóis outra faixa exclusiva que se afina com o tom de Aquele nenhum. É o solo vocal de Jards Macalé em Se queres saber, bolero do compositor alagoano Peter Pan (1911 – 1983), lançado em 1947 pela cantora Emilinha Borba (1923 – 2005).
Na sequência do disco Ó nóis, após Se queres saber, o samba torto O que começa acaba (Romulo Fróes e Clima) retoma a sinfonia dissonante desse álbum que reverbera experimentações sonoras já feitas pelo artista em álbuns como No chão, sem o chão (2009) e Barulho feio (2014).
Dialeticamente, o álbum Aquele nenhum abre com o samba-título do disco-irmão – Ó nóis, parceria de Romulo Fróes com Nuno Ramos – em gravação em que o toque do violão do artista ecoa bossas sempre novas que também estão embutidas no passo torto da abordagem nua e crua da já mencionada composição Me olha e me manda.
Entre silêncios e barulhos, Romulo Fróes acerta mais uma vez ao insistir no erro com os álbuns Aquele nenhum e Ó nóis, cumprindo a profecia de Macalé. Como reflete o cantor em versos de Numa cara só, “Nada deu ruim / Tudo ensina / Tudo tem seu bem”.
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