Concurso da PolÃcia Penal do Piauà retifica edital e remove HIV como causa de inaptidão
15/03/2024 15h32Fonte G1 PI
A banca organizadora do concurso público da Polícia Penal do Piauí atendeu a uma recomendação do Ministério Público do Piauí (MP-PI) e retificou o edital do certame para remover a condição de “portador do vírus HIV” como causa de inaptidão no exame de saúde. Confira o edital retificado.Ao g1, o Núcleo de Concursos e Promoção de Eventos (Nucepe) da Universidade Estadual do Piauí (Uespi) informou que “contemplou os itens da recomendação” feita pelo MP-PI. A retificação também foi confirmada pela Secretaria Estadual de Justiça (Sejus-PI), pasta responsável por promover o concurso.
O Ministério Público havia concedido à Sejus e ao Nucepe o prazo de cinco dias para responderem se acatariam ou não a recomendação. Caso não respondessem ou não retificassem o edital, o MP-PI poderia ajuizar ação civil pública contra os órgãos.
Imagem: Nucepe/UespiHIV e HTLV constavam como causas de inaptidão em concurso no PI; edital foi retificado.
O item removido constava do Anexo IV do edital, que elenca as causas de inaptidão nos exames médico e odontológico, mais especificamente no Grupo II, o qual destaca doenças infecciosas e parasitárias. Além do HIV, o vírus linfotrópico de células T humanas (HTLV), da mesma família, era listado como um dos impeditivos.
Segundo a promotora de Justiça Myrian Lago, a “exigência discriminatória” configurava uma “violação aos direitos humanos”, já que pessoas que convivem com o HIV, especialmente com carga viral indetectável por pelo menos seis meses e com boa adesão ao tratamento, apresentam risco insignificante de transmissão do vírus e expectativa de vida semelhante à da população geral.
“A causa de inaptidão se trata de medida puramente discriminatória de pessoas convivendo com o vírus HIV (sorofobia), não justificada nem pela Lei Estadual nº 5.377/2004, nem por argumentos científicos”, ressaltou a promotora.
Conforme a lei estadual, que dispõe sobre a carreira dos policiais penais do Piauí e é instrumento normativo do edital do concurso, o HIV não representa um impedimento para aprovados em certames da categoria assumirem seus cargos.
Além disso, a negação de emprego ou trabalho às pessoas que vivem com HIV e Aids, em razão de sua condição, é definida como crime de discriminação pela Lei Federal nº 12.984/2014, a qual prevê uma pena de um a quatro anos de prisão, e multa.
Casos semelhantes e decisão do STF
Em dezembro de 2022, um edital do concurso do Corpo de Bombeiros de Rondônia (CBM-RO) gerou polêmica entre entidades por considerar inaptos candidatos “portadores do HIV”. A seleção da corporação foi realizada pelo Instituto Brasileiro de Apoio e Desenvolvimento Executivo (Ibade).
Para a Comunidade Cidadã Livre (Comcil), o critério de desclassificação utilizado é inconstitucional e fortalece a exclusão das pessoas que convivem com o vírus.
Cinco meses depois, em maio de 2023, outro concurso do Corpo de Bombeiros, desta vez no Rio Grande do Norte, recebeu uma recomendação do Ministério Público estadual (MP-RN) para anular o resultado do exame de saúde de um candidato reprovado por “portar o HIV”.
Outro caso foi registrado em julho de 2023, quando a Justiça do Rio de Janeiro proibiu a Polícia Militar de exigir testes de HIV para candidatos dos concursos realizados pela corporação.
Os nomes dos candidatos são preservados de acordo com a Lei nº 14.289/2022, que mantém sigilo na identidade de pessoas que convivem com HIV e outras doenças.
A exclusão de pessoas com a condição em certames é inconstitucional, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2015, a corte considerou que a eliminação fere os princípios da igualdade e da não-discriminação e viola o direito fundamental ao trabalho, previsto na Constituição brasileira.
O que é sorofobia?
O preconceito e a discriminação contra pessoas que vivem com o vírus da imunodeficiência humana (HIV, na sigla em inglês) são classificados como sorofobia.
Os dados mais recentes do Ministério da Saúde revelam que quase 11 mil brasileiros morreram em 2022 tendo o HIV ou a Aids como causa básica. Mais de 43 mil casos de HIV foram registrados no Brasil no ano retrasado, e a estimativa é que um milhão de pessoas convivam com o vírus no país.
Um protocolo clínico divulgado pelo Ministério da Saúde em outubro de 2023 incluiu, pela primeira vez, o conceito de que pessoas que vivem com HIV ou Aids com carga viral indetectável têm risco zero de transmitir o vírus por via sexual.
A Aids, por sua vez, é a doença causada pela infecção do vírus da imunodeficiência humana (HIV, na sigla em inglês), o qual ataca o sistema imunológico, responsável por defender o organismo de outras enfermidades.
Desde 1996, o Brasil distribui gratuitamente medicamentos antirretrovirais (ARV) a todas as pessoas que vivem com HIV e necessitam de tratamento. Atualmente, existem 22 medicamentos, em 38 apresentações farmacêuticas.