Dia do Piauí: leia o poema sobre as riquezas do estado guardado há mais de 70 anos

19/10/2022 10h04


Fonte G1 PI

Imagem: Celso TavaresClique para ampliarPedra Furada é um dos pontos mais emblemáticos da paisagem piauiense(Imagem:Celso Tavares)Pedra Furada é um dos pontos mais emblemáticos da paisagem piauiense

No dia do Piauí, o g1 trouxe uma história de mais de 70 anos, sobre o advogado e dentista aposentado Fenelon Castelo Branco, nascido há 93 anos em José de Freitas, quando a cidade ainda se chamava Livramento. Um piauiense que foi morar em Pernambuco, mas levou consigo um poema como recordação de sua terra.

Em 1951, o poema abaixo foi declamado "de cabeça" por um fazendeiro chamado coronel Quincas Sampaio, para o senhor Fenelon, que o anotou e o levou consigo de volta para Recife.

Lá, ele passou a presentar amigos com cópias do poema, como uma amostra das riquezas do seu estado. O autor do poema, que teria passado o texto para o coronel Quincas, permanece desconhecido.

O poema Corologia do Piauí tem 39 estrofes, que se estendem por mais de dez páginas, com dezenas de nomes familiares aos piauienses: são listas de cidades, rios, frutas, peixes, aves, insetos... relata a produção agrícola da época, a culinária e os costumes, como a farinhada e os festejos.

Leia abaixo o poema na íntegra:

Corografia do Piauí

I

Sempre morei venturoso
no meu amado Piauí
terra que foi dos meus pais
onde também eu nasci.
Terra bela, entre as mais belas,
e melhor, entre as melhores,
onde os males da vida,
ninguém conhece os horrores.

II

Terra bendita onde almejo
o sono eterno dormir,
na mesma cova reunir,
nossas cinzas lentamente,
conforme Deus for servido,
valendo-me do futuro
como atrás me tem valido.

III

O Piauí é joia escondida no escrínio
do norte adusto e valente
onde os homens fortes herdam
ardência de um clima quente,
onde a vida em gala ostenta,
sempre em viço exuberante,
perfumes, cantares e festas,
carícias de amor constante.

IV

As tuas filhas são meigas,
cheias de graça e beleza
como tudo quanto cria
tua excelsa natureza:
teu sol fulgente, tens prados,
bosques, rios, palmeirais,
lagos, céu, Ina, estrelas
e infindos canaubais.

V

Belas, quais são assim belas,
só na lenda os anjos são,
têm nos olhos
que nem o céu
lampejos do sol a pino
e alvos clarões do luar.

VI

Mulheres não há quem possa
cantar as graças que têm
carne cheirando à baunilha,
colo cheirando a cecém.
Lábios, meu Deus! Lábios rubros,
como a flor do bacuri,
mãos pequenas e pés pequenos
e bravezas do juriti.

VII

Colo redondo e empinado,
rijo, cheiroso e fremente,
e afinal coisas que existem
que a gente advinha e sente,
vê de longe, inveja e sonha,
como sonhamos com o céu,
mas a Deus sempre dei graças
com a mulher que me deu.

VIII

Piauí queira o destino
que no teu seio sempre eu viva,
que minha alma te adora
das tuas glórias cativas.
Celebra cheia de orgulho
teus belos rios, teus prados,
as tuas aves e teus bosques,
tuas campinas e teus gados.

IX

Teus povoados florescem
nas mais formosas ribeiras:
Amarante, Floriano,
Marruá, Tapuia e Oeiras.
Campo-Maior e Patrocínio,
Piracuruca e São João,
Piripiri e Livramento,
Picos, Valença e União.

X

Teresina, nome augusto,
tens honra de Capital,
Alto-Longar, Barras e Manga,
Regeneração e Natal.
São Raimundo, Parnaíba,
Bom Jesus e Uruçuí,
Filomena, Parnaguá,
Jaicós, São Pedro e Poti.

XI

Campos Sales e Belém,
Amarração, Buriti,
Porto Alegre, Santo Antônio,
Paulista e Itamarati,
Miguel Alves, Corrente,
Castelo - antigo Marvão,
Altos, Peixe e Jerumenha,
Boa Esperança e Missão.

XII

Rios perenes, fecundos,
cortam o teu solo bendito:
Parnaíba, São Domingos,
Canindé, Junço e Sambito.
Môxa, Longá, Itanhin.
Dois de nome Uruçuí,
Gurgéia, Berlengas e Cocos,
Marataonhan e Piauí.

XIII

Santo Antônio, Jenipapo,
São Vicente e Paraín,
Poti, Guaribas, Riachão,
Táboa, Arraial, Portões,
Boa Vista e Gameleira,
Jacaré, Piracuruca,
Cágados, Peixe e Itahueira.

XIV

A flora seus dons espalha
no teu solo, fértil, belo,
tiquiá, mirindiba, braúna,
Parco: roxo e amarelo.
Jatobá, cedro e pau-santo,
chapada e bacurizeiro,
Gonçalo-Alves e paraiba,
pau-rato, jucá e pereira.


XV

Mutamba, inharé, candeia,
sapucaia e pequizeiro.
Marmelo e burdão-de-velho,
samambaia e marmeleiro.
Pau-terra, mufumbo, angico,
mama-cachorro e aroeira,
criolizeiro e jurema,
umburana e gameleira.

XVI

Jenipapeiro e favela,
maçaranduba, angelim,
o barbatimão, faveira,
catuaba, anil, pau-marfim.
Unha-de-gato e pau-pombo,
o pau-brasil, copaíba,
capitão-de-campo e almécega,
andiroba e carnaúba.

XVII

Oiticica e sambaíba,
rompe-gibão, mulungu,
tamboril, moreira, bilrro,
juazeiro e conduru.
Mororó & angico-branco,
o pau-mocó e O tinguí
cobrem de sombra & verdura
o meu querido Piauí.

XVIII

Sua fauna, vária e soberba
como mais rica não há,
a onça e o tatu-canastra,
calango, paca e preá.
Anta, cutia € raposa,
lagartixa e o quandu,
o furão, quanti, queixada,
guaxinim e caititu

XIX

Tatu verdadeiro e peba,
tatu bola e tatuí.
A lontra e maritacaca,
quati-puro e jaboti.
No gênero tamanduá:
o bandeira e o lapixó,
sonhin, macaco e guariba,
gato-do-mato e mocó.

XX

Veado, suçuapara,
o sutinga e o capoeiro,
a campeira - a cujo macho -
o povo chama gaeiro.
Guará, mucura, preguiça,
capivara e jacaré,
caranguejeira e tiú,
camaleão e punaré.

XXI

Cavalo de sela e campo,
o bode, o burro, o cameiro,
o boi de carro e o novilho
e o gordo porco de chiqueiro.
Cachorro — amigo do homem —
do pobre: guarda e sustento,
o gato nego e ligeiro,
e o forte e rude jumento.

XXII

Tuas aves agrestes e mansas
marreco, pato, urubu,
ganso, ema e pica-pau,
mergulhão e jaburu.
O mutum e as longas garças:
brancas, rosadas e cinzentas.
Seriema e papagaio,
e as corujas agourentas.

XXIII

O periquito, o canário,
o tucano e o bem-te-vi,
sabiá, xexéu, curica,
chico preto e juriti,
inhuma, jacu,perdiz,
zabelê, corrupião,
cigano, arara e recongo,
araponga e gavião.

XXIV

Carcará, pomba-de-bando,
a asa branca e a avoante,
cancão, anum, pintassilgo,
galinha, peru e cocaz.
Coleira, bigode, rola,
guinguirra e maracanã,
jandaia, bicudo, pega,
jacupemba e aracuã.

XXXV

Teus frutos, doces, mimosos,
tão bons, mais belos não há,
melão, mangaba, caju,
três espécies de araçá.
Umbu, ingá, guabiraba,
pitomba, chicá, pequi,
abacate, melancia,
tamarindo e bacuri.

XXVI

Jaca, puça, catolé,
ameixa, banana e manga,
ameixa, e manga,
oiti, romã, gravatá,
laranja, lima e pitanga.
Ananás, coco da prata,
cacau, condessa, crioli,
canapun, junco, goiaba,
maracujá e buriti.

XXVII

Murici, olho-de-boi,
maria-preta e juá,
o marmelo, o mamão,
abacaxi e cajá.
Cajuí, bruto, totó,
jatobá, araticum,
sapoti, maça, bacaba,
o figo, a ata e tucum.

XXVIII

Entre as abelhas e maribondos,
uruçu, tataíra,
canudo, bravo, tiúba,
manduri, limão, cupira,
trombeta, inchu, manda-saia,
a moça-branca, o inchui,
o manso, o breu, o mosquito,
boca-debarro e tobi.

XXIX

Maribondo de chapéu,
grande, vermelho e valente.
Sanharó, que no cabelo,
costuma pegar na gente.
Maribondo de chocalho,
o capuchu e o surrão,
o arapuá e o caboclo
e o feio cavalo do cão.

XXX

Nos rios e lagos pululam
o manduré e a sardinha
piratinga e surubim,
bico-de-pato e branquinha.
Curimatã e mandi,
arenque, piau, salmão,
corro, traíra, pescada,
piranha, arraia e cação.

XXXI

O ar é quente, mas as aragens
quebram do sol o rigor
e noite e dia suavizam
a ferra com o seu frescor.
Terra quente, mas sadia,
sem grandes alterações,
se sucedem brandamente
do ano as quatro estações.

XXXII

Pelo inverno os rios correm
e ferozes vão transbordando
em caldal profunda e grossa,
campos e bosques regando,
e até os humildes regatos,
pela seca estoricados
o dorso empolam, soberbos,
rugindo, em rios tornados.

XXXIII

Tudo o que é seco floresce
cheio de vida e verdor
quando cai a chuva santa
benção de Nosso Senhor.
No roçado viça inhame,
maxixe, milho e feijão,
mandioca, fava, abóbora,
melancia, arroz e melão.

XXXIV

O lavrador satisfeito,
o fumo cheiroso pitando,
com a família querida
passa os dias trabalhando.
Volta a tarde para casa,
o lavrador, mulher e filhos
com jerimuns e melancias,
feijão, macaxeira e milho.

XXXV

Chega o tempo da desmancha.
range alegre o Caítitu,
cai no cocho a massa fresca
para a farinha e o beiju
e com o rodo na mão calosa,
da casa o dono contente,
sentado no forno mexe
a branca farinha olente.

XXXVI

Virando a roda sonora
a nédia rapaziada
canta alegre em desafio
em tenra e doce toada.
Uns cantam e cantando, contam,
para alguém que os vê olhando
seus amores, e nos Olhares,
santo amor lhe estão jurando.

XXXVII

Velhos Crianças, mulheres,
sentados raspam mandioca.
E a meninada da roça
as cargas gritando toca.
E na cozinha as afamadas
mourejam à dona de casa
e recendem bolos de puba
no borralho junto à brasa.

XXXVIII

A noite finda a tarefa,
logo depois de cearem,
vão todos devotamente
um terço às almas rezarem.
Velho costume guardado
com grande veneração,
santamente, pelo povo,
de geração, em geração.

XXXIX

Em frente de um tosco santo
com dois rolos ao redor
o povo reza piedoso
de joelhos, com fervor,
as ladainhas e os benditos,
que o tirador vai tirando,
enquanto que o povo
responde em coro, cantando.

Texto de autor desconhecido.

Tópicos: terra, piau?, poema