MP quer ofertar implante hormonal e DIU na rede pública

23/07/2016 09h10


Fonte Cidadeverde.com

O Ministério Público do Distrito Federal investiga se é possível pedir ao governo que inclua anticoncepcionais de longa duração, como o dispositivo intrauterino (DIU) e o implante hormonal, na política pública de planejamento familiar. Na visão do MP, os métodos exigem menos disciplina das mulheres e, por isso, poderiam ser mais eficazes para moradoras de rua, presidiárias e usuárias de drogas, por exemplo.

Imagem: Cidadeverde.comClique para ampliarMP quer ofertar implante hormonal e DIU na rede pública.(Imagem:Cidadeverde.com)

No início de junho, as promotorias de Justiça de Defesa e de Defesa da Infância e da Juventude enviaram perguntas sobre o tema à Secretaria de Saúde, ao Ministério da Saúde e a entidades de classe do setor médico. A partir das respostas, os promotores vão verificar se o uso de anticoncepcionais mais duráveis é recomendado, e se o acesso a esses métodos já está sendo garantido.

"Trabalhei na área entre 1998 e 2002, e estou retornando agora à promotoria de Infância. Quando voltei, em janeiro, me assustei com o número de adolescentes grávidas, com 14 ou 15 anos e três filhos. Muitas foram acolhidas já com bebezinhos, usaram crack na gravidez. Não fizeram pré-natal na gravidez, tiveram que sair da escola, é um peso enorme para o corpo",
diz a promotora de Justiça da Infância Luciana Medeiros, idealizadora da investigação.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que o único método citado pelo MP e indisponível no SUS é o implante hormonal. Ferramentas como o DIU e o anticoncepcional de emergência (pílula do dia seguinte) são oferecidas a adolescentes e adultas, segundo a pasta, em acesso "amplo e livre de preconceitos, julgamento e questionamento".

Entre 2011 e 2015, o ministério registrou compra de 1,4 milhões de DIUs, 3,3 milhões de cartelas de pílulas do dia seguinte, 2,2 bilhões de preservativos e 18,4 milhões de ampolas injetáveis mensais, por exemplo. A pasta diz adotar outras ações de planejamento familiar como a Caderneta de Saúde de Adolescentes – são 32 milhões emitidas, entre masculinas e femininas – e o Programa Saúde na Escola (PSE).

Vulnerabilidade
A promotora de Justiça afirma que, segundo dados consolidados na literatura médica, a falta de exames pré-natais e de estrutura corporal das adolescentes aumenta o índice de mortalidade infantil. Para os bebês que sobrevivem, muitas vezes, o destino se divide entre os abrigos para vulneráveis e o sistema penal.

"Na classe média, alta, isso não acontece. Minhas filhas não têm colegas grávidas, menos ainda com três filhos. Na nossa classe social, as pessoas usam implantes hormonais, que têm menos efeitos tromboembólicos [de obstrução de veias] que a pílula. Eu posso pagar um método, um implanta, mas e quem não pode?",
diz Luciana.

Segundo a promotora, grande parte das adolescentes mais vulneráveis desconhece o funcionamento dos anticoncepcionais. Em consultas médicas, as jovens afirmam que engravidaram porque "não tomaram o anticoncepcional no dia anterior", mostrando que não sabem que o medicamento deveria ter uso continuado.

"A gente não pode impedir que as meninas tenham relações sexuais, até porque os núcleos familiares estão desestruturados. Mas podemos impedir essa gestão, garantindo que a jovem tenha direito ao estudo, ao lazer. A sociedade não quer emancipar a mulher? Nada é mais empoderador do que ela escolher quando vai ter filhos, quantos, se quer ou não quer ter um filho",
afirma.

Nos últimos 15 anos, segundo o Ministério, a gravidez na adolescência (10 a 19 anos) caiu 28,8%. Em 2015, 18,8% dos partos ocorreram nessa faixa etária, mas a projeção do governo é de redução de gestações em todas as idades nos próximos anos.

Projeto piloto
A ideia é implantar um "projeto piloto" no DF para adolescentes vulneráveis, a partir dos 10 ou 12 anos. A promotoria diz não ter medo de uma possível reação conservadora porque "os métodos são voluntários e reversíveis".

"Não adianta só colocar o método na rede, precisa de um ambulatório para implantar os dispositivos, exames prévios em alguns casos. Ainda assim, é mais barato que a rede de proteção que o governo cria para lidar com gravidezes não planejadas. Se a adolescente sai de um abrigo do governo com 18 anos e quatro filhos, ela não estudou, não se preparou. Pra onde vai levar as crianças? Como vai devolver algo a ela mesma ou à sociedade?",
diz Luciana.

Médica de saúde da família do DF, Denise Leite afirma que os métodos usados na capital são os mesmos padronizados pelo Ministério da Saúde e que o repasse deles tem sido regular nos últimos anos.

"A gente tem métodos, todos os métodos do Ministério da Saúde. O que acontece é que essas meninas não sabem, ou não têm acesso. A família às vezes tem muito tabu, não quer conversar. As escolas também não se sentem competentes, as adolescentes têm vergonha",
diz.

A lógica atual da secretaria não prevê "locais de referência" – isso significa que os métodos têm que estar disponíveis em todos os postos de saúde, UPAs e hospitais da rede pública. O modelo também prevê que as campanhas sejam levadas a abrigos e centros de internação mas, até agora, as iniciativas ainda são tímidas.

"A gente está na transição. O que já existe implantado é o atendimento ao sistema socioeducativo. As jovens [infratoras] internadas em Santa Maria e em semiliberdade no Guará têm uma equipe que as oriente. Para o pessoal em situação de rua, tem equipes que fornecem, que orientam",
afirma.

Denise explica que, até 2015, a orientação do Ministério da Saúde era para não indicar o DIU a adolescentes sem filhos. A liberação do dispositivo para todas as mulheres foi publicada há menos de um ano, e a instrução ainda está chegando ao atendimento "na ponta". Se for mal colocado ou associado a hábitos precários de higiene, o DIU pode levar a infecções e outras complicações.

"O que a gente tem que fazer é conscientizar, o tempo inteiro. Sobre a importância do preservativo, da dupla proteção. Não dá pra achar que já conversou muito sobre isso, que a internet informa, que a família é a única responsável. Se não ampliarmos a rede de atenção, não dá para colocar a política em prática".

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