Piauà estuda adotar protocolo espanhol para combater agressões sexuais
31/01/2023 08h55Fonte G1 PI
O Piauí pode adotar o protocolo espanhol No Callem, criado para combater agressões sexuais e violência machista. O secretário estadual de segurança Chico Lucas irá se reunir nesta terça-feira (31) com gestores da segurança e outras entidades para discutir a aplicação deste protocolo.A reunião irá acontecer dias depois da estudante de jornalismo Janaína Bezerra, de 22 anos, ser estuprada e morta durante uma calourada na Universidade Federal do Piauí (UFPI). O secretário destacou que antes mesmo deste crime brutal ocorrer já se havia discutido a introdução deste protocolo no estado.
“Eu quero reforçar essa discussão sobre este protocolo independe da ocorrência ou não desse crime bárbaro que assistimos no fim de semana. Já era uma discussão travada ao nível da secretaria das mulheres, da coordenação estadual das mulheres, como também nas Delegacias de Proteção dos Direitos da Mulher (Deams). Esse protocolo já havia sido discutido, já havia um pedido de audiência, faríamos a reunião para discutir a implantação desse protocolo, principalmente, por conta de fevereiro que é o mês de carnaval”, explicou.
Imagem: Reprodução/TV ClubeChico Lucas, secretário estadual de Segurança Pública do Piauí.
Caso seja implantado, o Piauí será o primeiro estado brasileiro a adotar o protocolo espanhol.
“Nós não podemos naturalizar nenhum tipo de violência. É um fato muito triste, lamentável, você que é pai de meninas, e eu também, que viu uma jovem perder sua vida, o seu futuro, nós temos que começar a reprovar socialmente e criminalmente aqueles que cometem atos de violência. No carnaval, aquele que tenta beijar forçadamente uma pessoa está cometendo ato de violência sim. É por isso que a gente não pode naturalizar, tem que reprovar, pra que atos como estes não cresçam e se tornam costumeiros e a gente tenha crimes bárbaros como este, violência contra a mulher de modo geral”, declarou Chico Lucas.
Sobre o protocolo
O protocolo No Callem foi aplicado no caso do jogador Daniel Alves, preso por estupro e agressão sexual contra uma jovem de 23 anos em uma boate em Barcelona, na Espanha. Um ponto central do protocolo é deslocar a atenção para as vítimas do abuso ou da agressão sexual. A prioridade das ações deve estar nelas, e não no agressor.
O protocolo dá um papel de destaque aos funcionários dos estabelecimentos, que devem ser capacitados para saber como prevenir e identificar a violência sexista e como agir em casos de agressão ou assédio sexual.
Outro diferencial é o acompanhamento da equipe por pessoal especializado em violência sexual, que pode oferecer orientações aos responsáveis e funcionários para garantir a correta aplicação das medidas de prevenção e de como lidar com um caso.
Cinco princípios
O protocolo No Callem se orienta por cinco princípios:
- O primeiro é que a atenção prioritária deve ser dada à pessoa atacada. Em caso de agressão, ela deve receber a devida atenção. Em casos graves, ela não pode ser deixada sozinha, a não ser que queira.
- O segundo princípio orientador é o respeito às decisões da pessoa agredida. Ela deve receber as informações e conselhos corretos, e ela deve tomar a decisão final, mesmo que esta pareça incompreensível para os demais.
- Terceiro princípio: o foco não deve estar num processo criminal. Estes são complexos, difíceis também para quem foi agredido e muitas vezes terminam de uma forma não satisfatória para quem sofreu uma agressão. Isso pode gerar frustração, e por isso é importante informar e levar em conta que existem outras formas de tratar a situação e dar importância ao processo de recuperação da pessoa agredida.
- O quarto princípio é a atitude de rejeição ao agressor. Deve-se evitar sinais de cumplicidade com ele, mesmo que seja apenas para reduzir o clima de tensão. É importante mostrar que há uma clara rejeição à agressão e envolver o entorno do agressor nessa rejeição.
- O quinto e último princípio é o da informação rigorosa. Tanto a privacidade da pessoa agredida como a presunção de inocência da pessoa acusada devem ser respeitadas. Por isso, é aconselhável não repassar informações oriundas de fontes não confiáveis ou espalhar boatos.
O que deve ser feito
A partir desses cinco princípios, o protocolo é estruturado em três eixos: as ações de prevenção, as instruções para identificar um caso, e as instruções sobre como lidar com um caso de agressão ou abuso sexual.
Como prevenção, o protocolo prevê que não sejam usados critérios sexistas ou discriminatórios para ingresso num espaço de lazer, por exemplo, cobrar valores de ingressos diferentes para homens e mulheres ou dar entrada gratuita ou vale-bebida para mulheres.
Os proprietários também não devem atentar para a aparência das mulheres na hora de decidir quem pode ou não entrar, nem aplicar códigos diferenciados de vestimentas para homens e mulheres.
O estabelecimento deve comunicar aos frequentadores que aplica o protocolo, e uma atenção especial deve ser dada às áreas escuras – em discotecas, por exemplo.
Ações promocionais não devem fomentar a desigualdade de gênero ou mostrar desrespeito por pessoas em razão de gênero ou diversidade sexual, por exemplo, na forma de cartazes que promovam códigos de vestimenta distintos ou que apresentem mulheres como objetos sexuais.
O protocolo ainda destaca, entre as ações de identificação, a importância de o local ter uma pessoa com formação mínima para identificar as diferentes formas de agressão e assédio sexual.
Da mesma forma, o local deve dispor de pessoal capacitado para dar atenção às vítimas e para coordenar a ação envolvendo o caso.
O protocolo ainda lembra que, em caso de flagrante, o agressor, segundo a lei local, pode ser detido por qualquer pessoa, e que o responsável pela segurança do local tem a obrigação de detê-lo.
Já a pessoa agredida deve ser levada a uma sala onde possa ser atendida, nos casos de agressão sexual, estupro ou abuso sexual grave. Nos demais casos não há necessidade de um espaço específico, mas este deve ser reservado e garantir tranquilidade e isolamento.