Promotor do caso de estupro coletivo é contra redução da maioridade penal
13/06/2015 12h40Fonte G1 PI
Imagem: Reprodução/TV ClubePromotor Cesário de Oliveira, em Castelo do Piauí.
O promotor de Justiça Cesário de Oliveira, responsável pelo caso do estupro coletivo ocorrido com quatro adolescentes em Castelo do Piauí, afirmou ao G1 que é contra a redução da maioridade penal. Apesar da posição, ele se diz a favor da extensão do período de permanência do adolescente infrator no sistema de internação. Com quase 20 anos de Ministério Público do Piauí, ele afirmou que nunca havia lidado com um crime tão cruel, mas pondera que o poder público tem que cuidar melhor de suas crianças.
“Temos que ser um país que ama e cuida de nossos jovens e eu não vejo esse amor atualmente. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) não é cumprido. Cadê a prioridade absoluta e a proteção integral previstos no estatuto?”
Em entrevista para o G1, o promotor disse que as políticas de assistência ao menor infrator são falhas e que até os advogados precisam de uma noção melhor das leis direcionadas para os adolescentes. Apesar das críticas, Cesário de Oliveira, que tem 62 anos, tenta manter o tom esperançoso com relação às instituições e aos próprios jovens que cometem delitos.
“A minha expectativa, pessoalmente, é que esses meninos (os suspeitos de cometer o estupro coletivo), possam a partir de agora, com a internação socioeducativa, se tornar cidadãos de bem. É esse o meu desejo”, afirmou.
G1 – O estupro coletivo ocorrido em Castelo do Piauí chamou atenção de todo o Brasil. Os defensores da redução da maioridade penal se sentiram ainda mais confiantes no seu ponto de vista e fazem lobby pela aprovação do projeto de lei em Brasília. O senhor é a favor da redução? Eu sou contra, mas sou a favor da extensão do período de permanência do adolescente infrator no sistema de internação. Em casos de crimes hediondos, eles deveriam ter um tempo maior de recuperação. Acho que essa deveria ser uma discussão essencialmente técnica e que deputados e senadores deveriam dar ouvidos a esse corpo técnico e multidisciplinar. E não fazer essa discussão no calor da emoção como está ocorrendo agora. Temos que rezar para que esse negócio não passe.
G1 - Quais seriam os efeitos da redução da maioridade penal?
Veja só, caso isso seja aprovado, os jovens do caso de Castelo só não morreriam na cadeia porque nossa lei só permite 30 anos de encarceramento. Que é o que deve acontecer com o Adão (adulto indiciado e apontado pela Polícia Civil como mentor do estupro e espancamento), que deve levar uma pena de mais de 100 anos. Temos é que de cuidar de nossas crianças. Temos que ser um país que ama e cuida de nossos jovens e eu não vejo esse amor atualmente.
O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) não é cumprido. Cadê a prioridade absoluta e a proteção integral previstos no estatuto? Outro dia estava falando com um prefeito e dizendo: cuida das crianças da tua cidade. Ele respondeu que quem deveria fazer isso era a família. Ele não entende que muitos desses jovens não têm família, falo isso no sentido de cuidado. ‘Esses meninos não querem nada, não querem aprender caratê, capoeira e nem música’, disse o prefeito. Falei que o papel do estado é ter outras saídas.
O que diz a bíblia sobre a ovelha desgarrada? Tem que resgatar essa ovelha, tem que dar atenção especial para ela porque as outras estão no caminho certo.
G1 – Existe uma incompreensão sobre os direitos das crianças e dos adolescentes?
Existe. Veja só, os defensores que vão fazer a defesa deles (os jovens suspeitos do crime) devem alegar que eles são inocentes. Quando a pessoa é maior de idade, o advogado faz tudo para absolver o cara, mas com adolescentes é diferente. Nessas situações de menores infratores, a defesa é diferente da de um réu adulto. O Ministério Público, os defensores e os juízes têm que buscar a medida mais adequada para corrigir a personalidade do adolescente. São varias as medidas previstas no ECA: matricular em uma escola, participar de grupo cultural, dar uma advertência. No caso dos jovens de Castelo, eu pedi a internação deles no Centro de Internação Masculino.
A intenção é que eles passem por medidas socioeducativas que evitem que esses jovens se tornem criminosos quando adultos. Muitos advogados não tem o conhecimento da doutrina da infância e da juventude. Já vi juízes que diziam que não tínhamos que encobrir a infração que aquele jovem cometeu, que tínhamos que enfrentar aquela situação e tentar corrigir.
G1 – Mas o próprio CEM sofre com infraestrutura precária e falta de segurança... (interrompi a pergunta) Os centros de educação estão longe de atingir os objetivos. A gente faz cumprir a lei, confia no estado e temos esperança que alguns jovens consigam sair melhores daquela vida. Muitos se recuperam. Existem situações terríveis em que o adolescente se recupera, se transforma em outra pessoa. Acompanhei um caso em Piripiri de um jovem violento, com várias infrações registradas. Depois da medida socioeducativa, ele mudou, está trabalhando.
Nenhuma das nossas instituições é perfeita, todas tem que melhorar muito, mas existem coisas boas. Todos nós temos falhas e temos que buscar a melhora, porque ainda ocorre muita remissão (reincidência de atos infracionais). Damos o perdão para o jovem infrator, dizemos para ele ser matriculado em uma escola, mas ele não vai. Em casos de situações repetidas, mesmo que de menor poder ofensivo, a gente opta pela internação.
Embora saibamos que existem falhas, mas a gente quer que as medidas da lei sejam efetivadas e tenham alguma eficácia. A minha expectativa, pessoalmente, é que esses meninos, que até hoje foram descuidados pelos pais e viviam com famílias desestruturadas, possam a partir de agora, com a internação socioeducativa, se tornar cidadãos de bem. Esse é o meu desejo.
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