Secretaria nega licenciamento de fazenda de soja no corredor ecológico Serra da Capivara

11/03/2023 10h50


Fonte G1 PI

Imagem: Celso Tavares/G1O Parque Nacional da Serra da Capivara reúne espécies de três biomas: além da caatinga, também a Mata Atlântica e a floresta amazônica.(Imagem:Celso Tavares/G1)O Parque Nacional da Serra da Capivara reúne espécies de três biomas: além da caatinga, também a Mata Atlântica e a floresta amazônica.

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) indeferiu a solicitação de licenciamento para empreendimento de plantação de soja e milho em área do corredor ecológico Capivara-Confusões. A solicitação já havia gerado repúdio na comunidade científica e o tema estava em discussão devido aos possíveis impactos ambientais.

O despacho assinado pelo secretário de Estado do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Daniel Oliveira, indeferiu a solicitação após constatação da área diretamente afetada (ADA) pelo empreendimento, que corresponde a 6.000 ha.A atividade é de uma propriedade localizada na BR-324/PI-140, zona rural do município de Brejo do Piauí.

“Por meio desse indeferimento, a Semarh reforça a política de sustentabilidade ambiental no Piauí e chama atenção para a necessidade de se garantir a proteção dos dois parques que integram a região”, disse o secretário Daniel Oliveira.

A ADA encontra-se na área que interliga as duas unidades de conservação de proteção integral: o Parque Nacional Serra da Capivara e o Parque Nacional Serra das Confusões. O corredor ecológico foi criado pela portaria do Ministério do Meio Ambiente n° 76/2015.

As duas unidades são reconhecidas em todo o mundo por sua relevância ambiental para a humanidade, por seu inestimável patrimônio arqueológico e espeleológico e pelas espécies da fauna e da flora que abrigam.

Fatores de impedimento

O indeferimento considerou a ausência de alternativas tecnológicas para o licenciamento da atividade na análise do Estudo de Impacto Ambiental (EIA).

Entre os fatores de impedimento para a liberação do empreendimento pela Semarh, está a forma escolhida para irrigação da soja, que pode impactar diretamente a disponibilidade hídrica em uma região extremamente seca.

Além disso, a utilização de pesticidas e agrotóxicos na área onde se tem espécies relevantes da fauna brasileira, como a onça pintada, e que é próxima a unidades de conservação do bioma Caatinga.

A análise da secretaria confirmou ainda o enorme impacto sobre a atividade de apicultura, de grande relevância econômica para a região do empreendimento.

“O diretriz da Semarh é que só haja empreendimento na área do corredor ecológico com sustentabilidade ambiental garantida e sem prejuízos à cadeia produtiva do mel na região sul do estado”, afirmou Daniel Oliveira.

Autorizada pelo ICMBio, mas negada pela Semarh

O empreendimento conseguiu a autorização para o licenciamento ambiental (ALA), expedida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), contudo, a Semarh destaca que esse fato não garante expedição de licenças ambientais, uma vez que esta é uma competência da pasta, com base na lei complementar nº 140/2011.

Além dos impactos sobre o corredor ecológico, que são de suma importância, a secretaria realizou avaliação mais profunda dos impactos ambientais decorrentes da atividade.

Repúdio da comunidade científica
Imagem: Arquivo PessoalSítio na cidade de Brejo do Piauí, na área do Parque da Serra das Confusões, sul do estado.(Imagem: Arquivo Pessoal)Sítio na cidade de Brejo do Piauí, na área do Parque da Serra das Confusões, sul do estado.

Pesquisadores e entidades divulgaram carta aberta criticando o projeto e explicando os impactos socioambientais que serão causados. O professor e paleontólogo Juan Cisneros, um dos autores da carta, contou ao g1 sobre a preocupação com a região, onde foram encontradas formações de arenitos, principalmente no Parque da Serra das Confusões.

Leia aqui a carta

"Há pequenas formações rochosas em arenitos que pertencem ao que a gente conhece como a formação cabeças, que são rochas de 400 milhões de anos. E nesse tipo de rocha nós encontramos muitos registros de fósseis de animais marinhos que viveram aqui no Piauí, quando aqui era fundo do mar. Esses vestígios nunca foram encontrados nessa região porque nunca houve pesquisas, mas é um local onde há um potencial muito grande",
explicou o professor.

Ainda segundo Cisneros, o empreendimento não impacta apenas no local em que será construído, mas em toda a região próxima. O professor ainda afirmou que a região de Brejo do Piauí tem a melhor evidência da glaciação na região Nordeste do Brasil.

"Apenas a dois quilômetros do local onde vai ser construído o empreendimento há um achado de uma formação conhecida como pavimento estriado. Esses pavimentos são formações naturais produzidas por glaciações, na era paleozoica, quando se formaram essas rochas o Piauí era muito frio. Lá tem a evidência melhor preservada da era Paleozoica encontrada no Nordeste”, declarou o pesquisador.

Licitação suspensa após recomendação do MPF

A Secretaria já havia suspendido a audiência pública sobre a licitação da construção da fazenda irrigada. O projeto previa plantação de soja e milho, em 12 mil hectares de terra, no corredor ecológico entre o Parque Nacional Serra da Capivara e o Parque Nacional da Serra das Confusões. A suspensão foi recomendada pelo Ministério Público Federal (MPF).

 

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