Advogado adota 20 filhos e deixa profissão para ajudar crianças carentes no PiauÃ
11/08/2019 10h13Fonte Cidadeverde.com
Imagem: Analice Borges/ Cidadeverde.com
A paternidade concretizou o sonho de ajudar crianças carentes de afetividade. O primeiro filho do advogado Marcos Régis, 35 anos, foi adotado após visitas a um abrigo de crianças. Atualmente, são 20 filhos que chegaram aos poucos e em paralelo o despertaram para a criação da Fundação Servos de Maria, instituição social que hoje acolhe mais de 600 meninos e meninas em situação de vulnerabilidade social na Cerâmica Cil, zona rural Sul de Teresina.
"Tudo começou em 2011 quando passei a ser voluntário em um abrigo de crianças. Através do projeto Padrinhos do Coração tive o contato mais próximo com algumas delas e passei a ficar o fim de semana, levá-los em passeios ou ajudá-los na escola. Em 2012, uma dessas crianças - que tinha cinco anos - se comportou de forma muita agressiva porque não aceitava a situação de abrigamento. Todas as famílias que tentavam adotá-lo, logo o devolviam", relembra Régis.
Essa criança com o comportamento tido agressivo viria a ser o primeiro filho de Marcos que não esquece "o frio na barriga" quando o garoto o perguntou: você pode ser meu pai?
"Fui chamado ao abrigo e me deparei com ele quebrando tudo do banheiro. Fiquei sem saber o que fazer porque ninguém tinha feito ele parar. Então, consegui chegar perto com algo que ele gostava, que era andar de skate. Eu disse que havia ralado o joelho após uma queda de skate. Ele olhou pra mim e disse: o senhor deste tamanho, não sabe andar de skate? eu disse que não! perguntei se eu o levasse pra casa, me ensinaria. Ele aceitou, parou de quebrar o banheiro e fomos. Quando chegamos em casa, o comportamento dele mudou. Não dava trabalho para tomar banho ou comer. Só aí que fui entender que a agressividade era uma forma de pedir socorro. Após dias na minha casa, ele perguntou se eu podia ser o pai dele. Eu disse que sim. Entrei em contato com o serviço social e me encaminharam. Fiz o pedido da primeira guarda", relembra o pai.
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Ele conta que os dois filhos seguintes vieram após o pedido do primeiro. Os demais vieram sucessivamente e com história de rejeição.
"Meu primeiro filho tinha dois irmãos sanguíneos no abrigo. Daí ele sempre me perguntava: será se meus irmãos comeram, têm biscoito? aquilo me tocava muito e resolvi visitá-los. Quando os irmãos entraram no carro, ele - que tinha cinco anos - disse: hoje vocês vão saber o que é ser feliz de verdade. Daí pensei que poderia fazer mais algo. Fiz o pedido da guarda dos irmãos dele. No dia que fui pra audiência, me deparei com dois adolescentes que estavam sendo devolvidos por uma família. Aí senti no meu coração o dever de fazer algo por eles também que me mostravam uma angústia de ter que voltar para um abrigo de menores. Hoje tenho crianças de abrigo, outras que retirei das ruas, que vieram de famílias da comunidade que não tinham como acolher", conta o advogado.
Marcos Régis conta que tem a guarda dos 20 filhos e está finalizando o processo de adoção da maioria deles. A família mora em uma casa alugada e sonha com a construção de uma residência mais ampla que começa a ser construída dentro da sede da Fundação Servos de Maria.
"Me preocupo não só em trazê-los para viver comigo como filhos, mas de dar dignidade, para que eles possam ter seu próprio cantinho, eu possa dar toda a minha vida. À medida que for criando condições, vou adotando quem precisa. Têm sido muito exitôso ver adolescentes que chegaram aqui rejeitados por outra família e hoje vão conseguindo realizar seus sonhos, seja no esporte, na escola. Isso me estimula muito a seguir em frente", diz Régis.
SER PAI
O filho mais novo de Marcos tem seis e o mais velho 16 anos de idade. Mesmo com a puxada rotina da instituição - que não conta com apoio do poder público, apenas doações - Marcos tenta manter uma rotina familiar comum para que os filhos tenham uma referência paterna afetiva. Para ele, ser pai é "ser um meio entre a vida e os bons caminhos".
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"Todo pai, por mais simples que seja, por mais ignorante que seja, creio que ele quer para os filhos, o melhor. Embora aqueles que erram e falham, a essência de todo pai é desejar o melhor para o filho. Ser pai é ser essa ponte que leva o filho da existência ao encontro com os bons caminhos, com a evolução humana positiva, que enriquece a si e ao mundo", ensina Marcos que considera os filhos um "presente de vida".
"Todos os meus filhos são um presente de vida e é um carinho muito grande sentir o amor dele. Meu primeiro filho, que hoje tem 12 anos, todos os dias de manhã, me dá um beijo e diz: Bom dia, amor da minha vida. Isso me comove as fibras mais profundas da alma. Ele diz que eu posso contar com ele pra tudo e que quando eu tiver velho vai cuidar de mim pra sempre", diz emocionado.
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SONHO REALIZADO
Ao Cidadeverde.com, Marcos Régis contou ainda sobre a criação da Fundação Servos de Maria em 2013 que foi idealizada após um sonho durante uma viagem para a Bahia.
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"Eu havia viajado para Salvador e após mais de 20 horas de viagem fui descansar e tive um sonho. Me vi dirigindo meu carro na estrada que vai para a Cerâmica Cil. Estava acompanhado de alguém que não conseguia visualizar o rosto, mas sabia que era alguém de minha confiança. No sonho, essa pessoa me falava coisas sobre o amor, a caridade e a esperança. Que eu tinha vindo com uma tarefa de auxiliar na mensagem do Cristo Jesus à humanidade. Que eu tinha vindo cumprir a tarefa de espalhar a mensagem do Mestre entre a população que mais sofria e precisava de esperança. Daí chegávamos na comunidade Cerâmica Cil. Mesmo no sonho, eu sabia que nunca tinha estado ali. Essa pessoa dizia pra eu entrar na próxima rua à direita. Então vi uma casinha simples e essa pessoa dizia que eu tinha chegado ao ponto de partida. Eu descia e ele dizia: meu filho, aqui neste lugar, você vai verdadeiramente começar a entender a sua tarefa, vai criar uma instituição que vai levar a mensagem de amor e esperança às que sofrem e ela vem com as bençãos da Mãe Santíssima de Jesus e deve ser uma fraternidade que leva o nome da legião dos Servos de Maria. Eu perguntava: o que devo fazer? ele me mandou abrir a porta e responder a mim mesmo se eu era capaz de conviver pelo resto da vida com três companhias inseparáveis: a solidão, a renúncia e as lágrimas. Eu tomava um susto porque ele me convidava a fazer um trabalho de amor e esperança e ao mesmo tempo me dava três companhias difíceis de conviver. Mas ele me dizia que todo aquele que quer seguir a Jesus tem que negar a si mesmo, todo aquele que cumpre grandes tarefas, também derrama muitas lágrimas e que eu ia me ver, em muitos trechos, arrodeado de muitas pessoas, mas com tarefas só minhas. Eu dizia: que seja feita a vontade de Deus. No sonho, quando abria a porta, via muitas crianças desenhando, uma cozinha com algumas pessoas que eu conhecia. Daí, acordei", relembra Marcos.
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Ao voltar para Teresina, o advogado conta que resolveu seguir o sonho e, para sua surpresa, se deparou com o que havia sonhado
"Quando eu voltei de Salvador, fiz o que vi no sonho e entendi que ali não tinha sido um sonho, mas algo muito superior ao que eu era capaz de comprender. Parei na frente da casa e tinha um homem limpando uma moto e para minha surpresa, uma mulher apareceu e perguntou se eu queria alugar. Não sei como criei coragem e disse que sim. Ela me disse que aquela pessoa estava saindo naquele dia e que eu podia alugar. Ali senti no meu coração que era algo a ser feito. Aluguei a casa e à noite tive outro sonho com a mesma pessoa que apareceu no primeiro. Ele disse como eu ia fazer, quantas crianças eu ia acolher e em 08 de dezembro de 2013 criei a fundação", conta.
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Marcos que, desde pequeno, organizava campanha de arrecadação de alimentos e acredita que a generosidade foi uma das heranças da avó materna. Apesar de tanto trabalho, ele disse que "não se vê fazendo outra coisa".
Atualmente, a instituição conta com 40 voluntários fixos que também doam suas vidas à Fundação Servos de Maria. No local são ofertados gratuitamente aulas de ballet, música, pintura entre outros. Por sábado, são distribuídos milhares de pratos de sopa.
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"Me sinto agradecido a Deus pela oportunidade de ser útil porque a gente compreende que a gente é muito mais ajudado quando ajuda alguém do que propriamente aquele que recebe nossa doação de alguma coisa. Tenho percebido o quanto tenho crescido humamente com a instituição. Sinto um prazer de existir e viver, por estar fazendo e vivendo aquilo que me proponho a ser para os outros", disse Marcos.
Imagem: Analice Borges/ Cidadeverde.comMarcos Régis
"Para mim é uma missão de vida. Meu maior sonho é deixar uma condição melhor de vida e de mundo. Saber que eu passei, mas minha existência contribui para tornar o mundo melhor. Tenho planos humanos de tornar a Fundação à altura das pessoas da comunidade, cada vez maior para que possa ajudar mais pessoas, uma marca de melhoria para o mundo", finaliza Marcos Régis.